Após as últimas semanas de isolamento que vivemos, prepara-se agora gradualmente o regresso à normalidade. Uma normalidade que será ainda bastante diferente daquilo que conhecíamos, pedindo-se, nesta fase, que se aprenda a conviver com o vírus.

Ora bem, tendo em conta que o vírus veio para ficar e que vamos ter efetivamente de viver com ele, nunca foi tão importante cuidar da sua alimentação e estilo de vida para que o seu sistema imunitário tenha todas as ferramentas necessárias para combater este vírus de forma eficaz, caso haja um possível contágio.

Em primeiro lugar, é importante perceber, de forma muito simplista, como funciona este vírus. O SARS-CoV-2 tem a habilidade de estimular uma libertação descontrolada de citocinas pró-inflamatórias, levando a um efeito de tempestade de citocinas, causando lesão tecidual e danos graves no epitélio respiratório.

Assim sendo, parece que a palavra a reter é inflamação, sendo esta a causa dos danos graves e mesmo da morte. Extrapolando um pouco o raciocínio, quem sofre contágio com um status inflamatório mais elevado, está, à partida, em maior risco de sofrer danos mais severos. E é isso que se tem observado! As pessoas com comorbilidades, nomeadamente obesidade, doenças autoimunes, hipertensão arterial, cancros, são considerados grupos de risco para esta pandemia e possuem, também todos eles, estados inflamatórios mais acentuados.

Portanto, a chave parece ser trabalharmos nos nossos estilos de vida, para melhorarmos o nosso status inflamatório e assim diminuirmos o risco de sofrer de uma doença crónica não transmissível. Ao mesmo tempo, é importante fornecermos as ferramentas para que o nosso sistema imunitário seja capaz de uma resposta adequada em caso de contágio. Como é que isso se faz?

Em primeiro lugar, e isto é, de longe, o ponto mais importante de todo este artigo. O grande segredo, o grande milagre, a pílula mágica para melhorar a sua alimentação do dia para noite é só um, coma COMIDA! Mas comida de verdade, daquela que não tem ingredientes, nem rótulos, nem marketing ou alegações de saúde. Falo de carne, peixe, marisco, ovos, vegetais, fruta, oleaginosas. Simples assim!

Comer comida de verdade deixa-o num ponto muito mais à frente que a grande maioria das outras pessoas no que toca à capacidade de resposta do seu sistema imunitário. Isto porque, quando comemos alimentos de verdade, o seu organismo recebe uma panóplia variada de vitaminas, minerais, antioxidantes, fitoquímicos, polifenóis, tudo aquilo que o organismo necessita para funcionar de forma correta. No entanto, e tendo em conta as necessidades e os requisitos específicos de cada indivíduo, é de extrema importância a individualização, razão pela qual é essencial ser acompanhado por um profissional da área da nutrição.

Outro ponto de extrema importância e que está diretamente relacionado com o anterior: a nossa imunidade começa no intestino e, portanto, ter um microbiota diversificado e saudável e uma mucosa intestinal íntegra é essencial. Sabemos que o microbiota é um grande responsável pelo status inflamatório do organismo, sendo, portanto, de máxima importância cuidarmos das nossas bactérias intestinais.

Para tal, é essencial o consumo adequado de fibra, solúvel e insolúvel. E portanto, voltamos a falar de frutas e vegetais! Estas deverão estar presentes em grandes quantidades na dieta de todos nós. Para além da fibra, o consumo de alimentos fermentados deve ser incentivado, nomeadamente vegetais fermentados (como por exemplo chucrute), kombucha e kefir, como forma de modular o microbioma e reparar a mucosa intestinal.

Tendo em conta que o vírus SARS CoV-2 é relativamente recente, ainda não são muitos os estudos que nos mostrem quais os compostos ativos que têm uma ação direta no vírus. No entanto, conhecendo o mecanismo de atuação do SARS CoV-2, podemos aferir ou deduzir quais os compostos que vão atuar na diminuição da capacidade do vírus infetar as nossas células, diminuir a replicação viral e dar suporte ao nosso sistema imunológico.

Assim sendo, existem alguns compostos ativos, vitaminas e minerais que atuam nestas diferentes vias. Alguns destes compostos podem ser obtidos através de suplementação específica e outros através da alimentação. No entanto, é preciso relembrar que a suplementação deve ser prescrita por um profissional de saúde, tendo em conta as necessidades e o historial clínico de cada um. Não é adequado tomar suplementos sem haver um motivo clínico que o justifique.

Naturalmente que nenhum destes suplementos impede o contágio e, neste sentido, apenas as medidas de higiene adequadas e o distanciamento social são eficazes. Não obstante, em caso de contágio, o nosso sistema imunitário tem de ser o mais eficaz a combater o vírus e a diminuir os sintomas associados.

Os seguintes nutrientes e compostos ativos de forma isolada parecem ser grandes aliados:

Vitamina A: desempenha um papel importante na função imune, regulando as respostas imunes celulares e humorais (Huang et al., 2018). A nível alimentar pode ser encontrada nas vísceras dos animais, como fígado, e nas gemas dos ovos. A suplementação só deve ser considerada caso se confirmem défices a nível sérico.

Vitamina C: contribui para a defesa imunológica, melhorando a quimiotaxia e fagocitose (Beveridge, Wintergerst, Maggini and Hornig, 2008). A suplementação com vitamina C pode não ser necessária caso a ingestão alimentar seja adequada. Para isso, é necessário consumir frutas e vegetais ricos em vitamina C ao longo do dia, nomeadamente kiwis, citrinos, morangos, pimentos, agrião e salsa.

Vitamina D: participa na modulação da resposta tanto do sistema imune inato como adaptativo. Parece haver uma relação entre o status de vitamina D do indivíduo e a resposta antiviral contra infeções respiratórias (Jayawardena et al., 2020).  A suplementação só deve acontecer caso existam défices, mas esta é muitas vezes necessária, especialmente durante os meses de Inverno.

Zinco: participa no funcionamento do sistema imunitário e diminui a replicação viral, reduzindo a gravidade das infeções. A deficiência de zinco está assim associada a uma maior susceptibilidade a infeções virais (Read, Obeid, Ahlenstiel and Ahlenstiel, 2019). No entanto, e uma vez mais, a suplementação só deve ser feita caso se verifiquem défices comprovados deste mineral. Na alimentação, pode ser encontrado nas ostras, na carne vermelha e nas sementes de girassol.

Selénio: possui propriedades anti-inflamatórias e um efeito antioxidante. A deficiência  de selénio está associada com uma função imune mais débil (Rayman, 2012). O consumo diário de castanhas do Brasil pode auxiliar na obtenção de valores adequados de selénio no organismo.

Melatonina: tem um efeito antioxidante e anti-inflamatório e promove uma diminuição nas citocinas inflamatórias em circulação (Zhang et al., 2020). A suplementação pode ser necessária, dependendo das necessidades do indivíduo.

Estas são algumas das estratégias a aplicar em termos alimentares. No entanto é importante (re)lembrar que as mudanças a efetuar devem ser de estilo de vida, onde se devem incluir hábitos de exercício físico regular, adequação de padrões de sono, gestão de stress e diminuição da exposição a toxinas. Todas estas alterações contribuirão para a diminuição da inflamação e para melhoria da função do sistema imunitário, tão importante para os tempos actuais e para a melhoria da nossa qualidade de vida.

Andreia Luís de Castro

Referências:

Beveridge, S., Wintergerst, E., Maggini, S. and Hornig, D., 2008. Immune-enhancing role of vitamin C and zinc and effect on clinical conditions. Proceedings of the Nutrition Society, 67(OCE1).

Huang, Z., Liu, Y., Qi, G., Brand, D. and Zheng, S., 2018. Role of Vitamin A in the Immune System. Journal of Clinical Medicine, 7(9), p.258.

Jayawardena, R., Sooriyaarachchi, P., Chourdakis, M., Jeewandara, C. and Ranasinghe, P., 2020. Enhancing immunity in viral infections, with special emphasis on COVID-19: A review. Diabetes & Metabolic Syndrome: Clinical Research & Reviews, 14(4), pp.367-382.

Rayman, M., 2012. Selenium and human health. The Lancet, 379(9822), pp.1256-1268.

Read, S., Obeid, S., Ahlenstiel, C. and Ahlenstiel, G., 2019. The Role of Zinc in Antiviral Immunity. Advances in Nutrition, 10(4), pp.696-710.

Zhang, R., Wang, X., Ni, L., Di, X., Ma, B., Niu, S., Liu, C. and Reiter, R., 2020. COVID-19: Melatonin as a potential adjuvant treatment. Life Sciences, 250, p.117583.

 

 

Este artigo é técnico e específico, se aquilo que pretende é apenas saber o que precisa fazer, pode ir directamente para a conclusão. Se, porventura, quiser educar-se um pouco mais sobre o potencial do exercício na sua saúde e imunidade, recomendo que vá buscar um café ou um chá e que leia o artigo completo.

Introdução

Uma das questões mais recorrentes nos últimos tempos em virtude do tema “Coronavírus” é se o exercício físico pode melhorar a função do sistema imunitário. Mas vamos recuar primeiro um pouco no tempo. A necessidade de se movimentar ou de fazer exercício para manter ou melhorar a saúde não é nova. O movimento sempre foi e sempre será uma necessidade essencial à condição humana. O problema actual é que no nosso estilo de vida moderno (altamente sedentário) a maior parte das pessoas esqueceu-se disso, deixou de alimentar a sua motricidade e pensa que consegue resolver os seus problemas de saúde com soluções rápidas ou temporárias de fitness.

Ou seja, se sabemos que o exercício tem a possibilidade de afectar todos os órgãos e sistemas do corpo humano, é natural (e desejável) que o sistema imunitário seja também regulado pelo nível de actividade física de cada indivíduo. A inactividade física em conjunto com a perda de massa muscular (e alimentação deficiente) irá facilitar a imunosenescência, a perda de função do sistema imunitário. Clinicamente, isto significa um maior risco de infecções, reactivações mais frequentes de vírus latentes, diminuição da eficácia da vacinação e aumento da prevalência de doenças auto-imunes e cancro1.

Portanto, temos por um lado o movimento ou a actividade física, que é transversal à evolução de qualquer homo sapiens e, por outro, temos o treino físico, que pode ser o catalisador para elevar os resultados da performance humana para outros patamares. A percepção geral de que a actividade física regula o sistema imunitário é correcta mas a ideia generalizada de que qualquer forma de exercício melhora o sistema imunitário é incorrecta. Simplesmente não podemos ignorar os princípios elementares da biologia humana e do ciclo de stress, recuperação e adaptação inerentes a cada indivíduo.

Contextualização da imunologia do exercício

Embora a imunologia do exercício seja considerada (relativamente) uma nova área de investigação científica, com 90% dos trabalhos publicados após 19902, alguns dos primeiros estudos foram publicados há mais de um século. Por exemplo, em 1902, Larrabee3 demonstrou que as alterações nas contagens diferenciais de glóbulos brancos nos corredores de maratona de Boston eram semelhantes às observadas em certas condições de doença, com uma “considerável leucocitose do tipo inflamatório”.

De acordo com a revisão efectuada por Nieman4, uma das maiores autoridades mundiais em imunologia do exercício, e que por acaso já correu mais de 50 maratonas, as descobertas científicas neste campo podem ser divididas em quatro períodos distintos. De 1900 a 1979, o foco era nas alterações agudas e na função das células imunitárias. De 1980 a 1989, vários estudos sugeriram que o esforço de intensidade elevada estava associado com uma disfunção imunitária transiente, com a elevação de biomarcadores inflamatórios  e com um aumento do risco de infecções do trato respiratório superior. Durante o período de 1990 a 2009, foram adicionadas outras áreas complementares de estudo, incluindo o efeito interactivo da nutrição, os efeitos do exercício no envelhecimento do sistema imunitário e as influências nas citocinas inflamatórias. A partir de 2010, com os avanços na espectometria de massa e na tecnologia associada aos testes genéticos, começou-se a depositar maior atenção em áreas de estudo como a metabolómica, lipidómica, proteómica e microbioma, com o intuito de fornecer directrizes mais personalizadas ao nível da nutrição e exercício.

Portanto, já sabemos há muito tempo que o sistema imunitário é muito sensível ao exercício físico e, como tal, será a extensão e a intensidade do exercício, que vão reflectir o nível de stress fisiológico imposto ao sistema imunitário. Claramente, durações e intensidades elevadas em simultâneo não fazem bem à saúde.

O envelhecimento e o seu impacto na imunosenescência

A deterioração do sistema imunitário com a idade deve-se principalmente a factores biológicos, como a genética e às interacções com factores ambientais (como a exposição a agentes infecciosos, incluindo citomegalovírus), impondo alterações metabólicas causadas por estilos de vida não saudáveis (exercício inadequado, dieta inadequada) e stress fisiológico prolongado5,6.

A imunosenescência associada ao envelhecimento acontece pelo menos através dos seguintes três fenómenos: 1) redução na resposta imunitária; 2) aumento da inflamação e oxidação (em inglês inflammaging e oxi-inflammaging); 3) produção e libertação de auto-anticorpos.

No caso do primeiro, o envelhecimento influencia principalmente a imunidade através de alterações na estrutura e actividade do timo (i.e., atrofia do timo), uma glândula com importantes funções imunitárias localizada entre os pulmões, da redução na produção de linfócitos (linfopoiese primária)7,8, do declínio das células T ingénuas, da acumulação das células T memória e de uma diminuição na produção de anticorpos9-11. O envelhecimento também está associado ao declínio das células estaminais hematopoiéticas (hemocitoblastos) e à função das células progenitoras, resultando num aumento da produção de células da linhagem mielóide e diminuição no potencial linfóide12.

No que diz respeito ao segundo, o envelhecimento poderá contribuir para o aumento da secreção de citocinas inflamatórias (interleucina-1 [IL-1], factor de necrose tumoral alfa [TNF-α], interleucina-6 [IL-6] e proteína C reactiva [PCR])13. Com o avançar da idade, os macrófagos, que actuam como sentinelas e residem nos tecidos conjuntivos e orgãos do corpo, tornam-se mais pró-inflamatórios, libertando maiores quantidades de TNF-α e de interleucina-12 (IL-12)14, o que pode acelerar os danos nos tecidos.

Finalmente, no que concerne ao terceiro, o aumento da produção e libertação de auto-anticorpos poderá levar a um aumento de manifestações auto-imunes15,16.

Efeitos do exercício na imunosenescência

Muitos trabalhos têm demonstrado que um estilo de vida fisicamente activo pode ter efeitos positivos no envelhecimento do sistema imunitário17,18. Em particular, o exercício físico regular parece afectar os processos de envelhecimento do sistema imunitário inato (também chamado de não específico) e adaptativo (também chamado de específico ou adquirido). Por exemplo, um dos testes mais robustos para medir a competência imune é a resposta mediada por anticorpo ou célula a novos antígenos, frequentemente administrados experimentalmente por vacinação. As respostas humorais (imunidade mediada pelos linfócitos B) e celulares (imunidade mediada pelos linfócitos T)  à vacinação parecem ser mais fortes nos indivíduos activos em comparação com os indivíduos sedentários e mais fortes também naqueles que realizaram formas de exercício estruturado nos meses que antecederam a administração da vacina19,20.

O exercício regular no envelhecimento parece estar associado a um melhor funcionamento das células natural killer (NK)21, a primeira classe de glóbulos brancos a actuar em resposta a qualquer vírus, bactéria ou tumor. Da mesma forma, o funcionamento dos neutrófilos parece ser afectado positivamente, uma vez que idosos saudáveis e mais activos têm uma melhor migração de neutrófilos em direcção à interleucina-8 (IL-8)22, uma citocina com efeitos na angiogénese23 (formação de novos vasos sanguíneos) e, potencialmente, no desenvolvimento muscular. As intervenções com exercício demonstraram diminuir o número de monócitos inflamatórios circulantes CD16+24 (o termo CD significa “cluster of differentiation” e surgiu como forma de diferenciar as diferentes classes de células imunológicas) e a melhorar a função dos neutrófilos e a fagocitose em pacientes com artrite reumatóide25.

Estudos transversais antigos em idosos demonstraram que mulheres altamente treinadas mostraram uma melhoria na proliferação de células T induzidas por mitógeno em comparação com um grupo não treinado21. A melhoria da proliferação das células T também foi relatada noutro estudo de corredores idosos que treinaram uma média de 17 anos. Estes resultados foram associados com um melhor funcionamento do sistema imunitário adaptativo26 e sugerem que uma capacidade cardiovascular aumentada previne a acumulação de células T senescentes.

Devido a estas descobertas, Minuzzi et al.27 recrutaram 19 atletas master (mais de 40 anos) com 20 anos de experiência de treino e compararam o seu sistema imunitário com um grupo de controle sedentário composto por dez indivíduos com idades aproximadas. Neste estudo, os investigadores concluiram que o exercício tem a capacidade de não apenas prevenir a acumulação das células T senescentes ao longo da vida, como também de potenciar a sua exclusão através de mecanismos como a apoptose. Assim, estes dados revelam-nos que o treino físico regular é capaz de reverter as alterações associadas com a idade nas subpopulações de linfócitos e de reduzir parcialmente o declínio das funções das células T relacionadas com a idade.

Num estudo57 publicado recentemente (Março 2020), com dados recolhidos num hospital de Whuan (China), aparentemente a cidade que se tornou o epicentro da pandemia covid-19, os autores sugeriram que a linfopenia (contagem reduzida de linfócitos no sangue) é um indicador eficaz para predizer a severidade dos sintomas do covid-19 e propuseram um modelo de classificação de risco com base na percentagem de linfócitos no sangue. Neste trabalho, os autores verificaram que os indíviduos com uma percentagem de linfócitos mais baixa, tinham pior prognóstico e maior risco de mortalidade.

O músculo esquelético como um órgão imuno-regulador

O músculo esquelético é reconhecido como um órgão endócrino capaz de expressar e secretar citocinas (conhecidas como miocinas ou mioquinas) no sistema circulatório durante a actividade física28. A interleucina-6 (IL-6) foi a primeira miocina identificada e pode ser considerada uma das mais eficazes na regulação do sistema imunitário. A IL-6 é produzida logo após o início da actividade física e os níveis produzidos dependem de vários factores como a intensidade do exercício, a duração do exercício e a quantidade de massa muscular utilizada29. Na verdade, as nossas células musculares já produzem IL-6 basal mas o exercício pode aumentar essa libertação em mais de 100 vezes30.. Mas há aqui uma questão muito importante a destacar e que normalmente gera alguma confusão. Por um lado, a IL-6 produzida através das contracções musculares exerce um potente efeito anti-inflamatório (via c-Jun terminal kinase/activador proteína-131) que leva à produção de outros mediadores regulatórios como interleucina-10 (IL-10), receptor antagonista da interleucina-1 (IL-1RA) e à inibição do factor de necrose tumoral alfa (TNF-α) pelos monócitos e macrófagos32,33. Mais, a IL-6 também estimula a libertação de cortisol pelas glândulas supra-renais, proporcionando assim um segundo sinal anti-inflamatório34. Por outro lado, a IL-6 derivada da via de sinalização factor nuclear-kB (NF-kB35) tem um efeito pró-inflamatório e está naturalmente associada a estados de inflamação crónica e de fraca saúde. Recentemente, numa análise a 150 pacientes infectados de dois hospitais em Whuan (China), Ruan et. al.58, verificaram que as concentrações de IL-6 diferiam significativamente entre sobreviventes e não sobreviventes do covid-19, com os não sobreviventes a registar valores 1,7 vezes mais altos, indicando que a IL-6 elevada (não aquela derivada das contracções musculares) também tem repercussões negativas na imunidade. Pode fazer algumas respirações diafragmáticas agora 🙂

Além da IL-6, outras citocinas como a interleucina-736 (IL-7) e interleucina-1537 (IL-15), expressam-se também através das contracções musculares. A IL-7 é necessária para o desenvolvimento de timócitos38 e tanto a IL-7 como a IL-15 são factores proliferativos de linfócitos (especialmente para as células T ingénuas39), que têm tendência a diminuir com a idade e com a inactividade física40. A IL-15 proveniente do músculo ainda aumenta a actvidade das células natural killer (NK) e tem uma influência na redução de gordura através da inibição da lipogénese41. Outras miocinas libertadas pelos músculos também têm sido apontadas na literatura pelos seus efeitos metabólicos e imunológicos, contudo é importante ter presente que os músculos podem segregar mais de 600 miocinas e que ainda há muito por investigar nesta área de estudo, a que alguns autores já designam de “miocinoma”42.

De facto, o treino ao longo da vida também parece afectar os níveis basais de citocinas pró e anti-inflamatórias. Neste estudo levado a cabo por Minuzzi et. al.43, que teve como objectivo analisar os efeitos do envelhecimento e do treino ao longo da vida nas principais citocinas pró e anti-inflamatórias, ficou expresso que os níveis de IL-1RA, interleucina-1 beta (IL-1β), interleucina-4 (IL-4) e interleucina-8 (IL-8) de atletas master estavam mais equilibrados quando comparados com dois grupos sedentários de idade semelhante e de idade mais jovem.

Portanto, o músculo esquelético deve ser visto como a nossa farmácia endógena, um património importante a preservar ao longo da vida que vai ajudar a aumentar a imunidade. Uma reserva de nutrientes e aminoácidos que vai defender o corpo em situações de doença e na recuperação de qualquer evento traumático. Logo, um investimento no desenvolvimento de saúde e imunidade passa desde logo por manter a massa muscular e um estilo de vida activo.

Efeitos agudos e efeitos crónicos do exercício na imunidade

A evidência indica que os mecanismos associados à alteração da função imunitária com o exercício estão relacionados com vários factores, como estímulos do sistema neuroendócrino (catecolaminas, cortisol), estímulos metabólicos (i.e., hidratos de carbono, antioxidantes ou prostaglandinas)44,45, bem como com o débito cardíaco, fluxo sanguíneo, pressão arterial, forças de cisalhamento, entre outros. Alguns estudos parecem sugerir que os efeitos agudos do exercício (e.g., apoptose de algumas células) podem estimular a mobilização de células estaminais hematopoiéticas da medula óssea e de células imunes senescentes dos tecidos periféricos para a circulação46.

Mas a resposta imunitária aguda ao exercício depende da duração e intensidade do mesmo. No âmbito da revisão efectuada por Nieman et. al.4, os autores diferenciaram exercício moderado e vigoroso, utilizando um limiar de intensidade de 60% do VO2 máximo e frequência cardíaca de reserva, e um limiar de duração de 60 minutos. O exercício agudo estimula o intercâmbio de células e componentes do sistema imunitário inato entre os tecidos linfóides e o sangue. Embora transitório, ocorre um efeito cumulativo ao longo do tempo, com melhor vigilância imunitária contra agentes patogénicos, células cancerígenas e uma diminuição da inflamação sistémica4. É por este motivo que tanto a saúde como a imunidade constroem-se todos os dias e não com shots de imunidade, com exercício pouco consistente ou com programas de transformação corporal de curto prazo.

Durante exercícios aeróbios de intensidade moderada e vigorosa em períodos de duração inferior a 60 minutos, a actividade protectora dos macrófagos teciduais ocorre paralelamente a uma recirculação aprimorada de imunoglobulinas, citocinas anti-inflamatórias, neutrófilos, células NK, células T citotóxicas e células B imaturas, que são essenciais na melhoria da saúde imunitária e na saúde metabólica. Estas sessões curtas de exercício de intensidade moderada mobilizam preferencialmente as células NK e as células T CD8+, que exibem alta citotoxicidade e vão atacar especificamente as células infectadas. Ao longo do tempo esta imunovigilância vai aumentando e, naturalmente, o potencial terapêutico do exercício também.

Muitos estudos sustentam que altas cargas de trabalho, competições e o stress fisiológico, metabólico e psicológico associados estão ligados à disfunção imunitária, à inflamação, ao stress oxidativo e ao dano muscular. De facto, vários biomarcadores da função imunitária podem ficar alterados durante várias horas a dias durante a fase de recuperação, mas isto acontece especialmente no caso dos indivíduos que fazem exercício prolongado e intenso, como por exemplo maratonas. A ligação entre exercício intenso e prolongado e o aumento do risco de doença já tem sido estudada desde os anos 80 / início dos anos 90. Os primeiros estudos epidemiológicos indicaram que os atletas envolvidos em eventos de maratona, ultramaratona e/ou de intensidades muito elevadas estavam em risco aumentado de infecções do trato respiratório superior.

Na realidade, quando analisamos os estudos realizados neste âmbito (relação entre exercício vigoroso e doença), verificamos que a maioria foram realizados com atletas de endurance (maratonistas, ultramaratonistas, triatletas, nadadores, esquiadores) e com atletas de elite, indivíduos que são submetidos a cargas de trabalho e a níveis de stress bastante diferentes de um atleta recreativo. O custo de se tornar um atleta de elite será sempre a saúde e como tal não podemos comparar laranjas com maçãs. Embora Campbell et. al.47 tenham desafiado o significado clínico e a ligação entre esforço intenso e disfunção imunitária transiente (uma questão que irá ser explorada mais abaixo), a maioria dos investigadores na área da imunologia do exercício apoia a posição que o sistema imunitário reflecte a magnitude do stress fisiológico imposto ao seu praticante. Mas atenção, isto não significa que a intensidade não possa ser elevada, isto significa é que a intensidade e outras variáveis do treino precisam de ser geridas de forma criteriosa.

Influências clínicas do exercício crónico nas infecções respiratórias

Cada período de actividade física moderada promove melhorias transientes na imunovigilância e, quando repetida regularmente, confere múltiplos benefícios à saúde, incluindo menor incidência de doenças respiratórias e inflamação. Os ensaios clínicos randomizados (8 semanas a 1 ano de duração)21,49-53 são consistentes na demonstração que os indivíduos que participam em programas de exercício moderado ou meditação52,53, experimentam menor incidência e duração de infecções do trato respiratório superior. A magnitude da redução destes sintomas com a realização de exercícios moderados quase diários é geralmente de 40% a 50%, excedendo os níveis relatados para a maioria dos medicamentos e suplementos.

Neste estudo efectuado por Nieman et. al.48, foram seguidos durante 12 semanas um grupo de 1002 adultos (18-85 anos; 60% mulheres e 40% homens), metade durante o inverno e a outra metade durante o outono, com a finalidade de monitorizar os sintomas de infecções do trato respiratório superior. Os resultados indicaram que o número de dias com infecções respiratórias foi 43% menor em indivíduos envolvidos numa média de cinco ou mais dias por semana de exercício aeróbio (20 minutos ou mais) em comparação com os indivíduos sedentários (≤  1 dia / semana) e 46% menor para aqueles que estavam em melhor forma física.

Adicionalmente, conforme referido na secção “efeitos do exercício na imunosenescência”, há também uma melhoria na resposta de anticorpos à imunização contra o vírus da gripe em idosos que incorrem em programas regulares de exercício físico20.

O mito da supressão imunitária induzida pelo exercício

Num artigo de revisão publicado há cerca de dois anos atrás, Campbell et. al47, colocaram algumas questões relevantes, que devem merecer a nossa atenção. Os estudos que indicaram um maior número de infecções do trato respiratório superior decorrentes da “actividade física”, além de terem sido auto-reportadas (i.e., não foram efectivamente medidas através de análises laboratoriais), foram realizados em maratonistas e ultramaratonistas, sugerindo que essas infecções têm maior probabilidade de acontecer quando a duração e a intensidade do exercício são muito elevadas. Por outro lado, é preciso ter presente que essas infecções poderão também ser o resultado de muitas outras causas, algumas mais directamente associadas com essas práticas desportivas (cargas de trabalho muito elevadas, alergia, asma, inflamação não específica das mucosas, hiperventilação própria do exercício, exposição a temperaturas mais frias) e outras de carácter mais geral mas não menos importantes (maior stress psicológico, ansiedade, deficiências nutricionais, exposição a grandes aglomerados populacionais, fadiga, sono inadequado, viagens e adaptação a novos fusos horários, desidratação). Isto significa que o sistema imunitário poderá já estar em maior risco antes de iniciar o exercício. Assim, da mesma forma que existe evidência (com as devidas limitações) a confirmar que o exercício pode aumentar o risco de infecção, também existem vários estudos epidemiológicos a indicar que o exercício pode reduzir o risco de infecção, inclusivamente em atletas de elite, que estão sujeitos a elevadas cargas de trabalho.

Outro pilar da imunologia do exercício que recebeu considerável atenção nas últimas três décadas é a avaliação das alterações induzidas pelo exercício na imunidade das mucosas, principalmente através da medição dos níveis de anticorpos da imunoglobulina A (IgA) na saliva. A função principal da IgA é prevenir a entrada de organismos invasores na circulação e como tal a sua concentração aumentada ou diminuída poderá revelar uma imunidade mais forte ou mais fraca, respectivamente. Mais uma vez, os estudos aqui estão divididos e os autores apontam várias limitações que podem deturpar a secrecção de IgA: os níveis absolutos de IgA relatados não controlaram adequadamente a quantidade de saliva produzida; o estado da saúde oral é raramente avaliado; ritmo circadiano; stress psicológico; género; etnia, doença; medicamentos; tabaco e fase do ciclo menstrual. Pelo que é arriscado dizer-se que quaisquer alterações subtis na IgA salivar após o exercício reflectem a supressão imunitária e um risco aumentado de infecções oportunistas.

Já constatamos que o sistema imunitário é estimulado durante o exercício mas nas horas após o exercício, geralmente é observado que a frequência e capacidade funcional dos linfócitos do sangue periférico diminui para níveis inferiores ao pré-exercício, levando alguns autores a propor que o exercício induz uma janela de imunosupressão, fenómeno designado de “janela aberta”. Mas em vez de suprimir a competência imune, um ponto de vista mais actual é que essa linfopenia aguda e transitória 1 a 2h após o exercício é benéfica para a vigilância e regulação imunitária. De facto, no que parece ser uma resposta altamente especializada e sistemática, tem sido proposto que o exercício vai, por via da estimulação adrenérgica e libertação de adrenalina, mobilizar as células imunitárias para a circulação e depois redistribuir essas mesmas células para os tecidos periféricos (i.e., superfícies mucosas como pulmões, intestino, pele) para conduzir a vigilância imunológica e providenciar feedback à medula óssea para iniciar a produção de novas células imunitárias. Estas células imunitárias são recrutadas do baço, dos nódulos linfáticos, do intestino e de células imobilizadas ao longo das paredes vasculares. Esta redistribuição das células imunitárias (em particular das células NK) é, na verdade, um dos mecanismos apontados para a redução dos tumores em pacientes com cancro54,55 (infelizmente esta forma de imunoterapia ainda não é levada a sério) e o seu aumento é proporcional à intensidade do exercício56.

Para haver adaptações significativas ao nível do treino é preciso que o mesmo seja progressivamente intenso. Intenso não significa necessariamente mais longo, significa intenso para o indivíduo que está a realizar o exercício. E para fazê-lo de forma responsável, é preciso atender ao seu historial clínico, à sua mobilidade articular e à sua capacidade de trabalho, ou seja, é preciso avaliar o indivíduo para poder compreender a sua tolerância. Um indivíduo que treina de forma consistente há muitos anos terá respostas diferentes ao nível do sistema imunitário quando comparado com um indivíduo sedentário ou pouco regular no exercício. Tal como qualquer intervenção cirúrgica, o exercício também precisa de ser bem administrado para ser eficaz.

Conclusão

Vivemos numa cultura de elevado sedentarismo em que não é necessário fazer qualquer tipo de esforço físico para sobreviver. As pessoas habituaram-se a não fazer nada do ponto de vista físico para sobreviver mas agora de repente parece que descobriram que podem e devem ser mais activas. A disseminação de exercícios sem critério e de aulas online gratuitas nestes últimos tempos tem sido própria da histeria que se vive num arraial. A falta de consciência de alguns profissionais, que certamente estão a tentar ajudar, também não tem ajudado. O que mais me preocupa nesta história toda é que na internet vale tudo e não há qualquer tipo de filtro. E devido a esta falta de cultura e literacia física colectiva, a maior parte das pessoas não tem educação suficiente para distinguir o bom do mau, nem o excelente do medíocre. Qualquer coisa serve, independentemente se tem qualidade ou não.

Para quem não sabe para onde vai qualquer caminho serve, disse o gato na célebre história de Alice no País das Maravilhas, em resposta à sua exclamação “eu não sei para onde quero ir!”. Esta questão do covid-19 veio confirmar que a atitude diária das pessoas rege-se mais pelo medo, que pelos seus objectivos e desejos. Os media sabem disso e exploram muito bem essa fragilidade das pessoas. O bombardeamento de informação sobre esta matéria tem sido estridente e hoje em dia é cada vez mais difícil distinguir a verdade da mera opinião de jornalistas e de pseudo-especialistas. O medo é o principal supressor do sistema imunitário, o cortisol e as hormonas do stress vão superar a energia necessária para combater a infecção. Esta é uma questão que decorre da nossa evolução enquanto espécie, se estivesse doente e tivesse que fugir de um animal que me queria fazer mal, eu iria canalizar toda a minha energia para esse efeito, ou seja, eu iria lutar com todas as minhas forças para combater esse animal. A situação do covid-19 veio confirmar também que temos uma população débil que investe muito pouco no desenvolvimento da sua saúde e imunidade. E quanto maior o número de comorbilidades, sinais e sintomas de perda de saúde, maior é o risco de adoecer e morrer.

Em relação ao exercício físico, e com base na revisão de literatura efectuada e na nossa experiência prática no acompanhamento de indivíduos imunossuprimidos, maioritariamente doentes oncológicos, há várias coisas que deve fazer para aumentar a sua imunidade e bem-estar geral. Aqui ficam as principais recomendações:

  1. Mantenha-se o mais activo possível e evite passar muito tempo seguido sentado. Passar muito tempo sentado é altamente nocivo! Tenha presente que o movimento sempre foi uma necessidade essencial à vida humana e afecta todos os sistemas e órgãos do corpo. O facto de hoje não ter problemas de saúde devido ao seu comportamento sedentário é apenas uma questão de tempo. (nota: manter-se activo no seu dia a dia não é igual a manter as suas articulações, a sua postura, a sua musculatura e a sua competência de movimento em bom estado. Para optimizar a sua função corporal e retirar maiores benefícios precisa de dedicar tempo à avaliação e ao tratamento da sua condição músculo-esquelética).
  2. Seja consistente na sua adesão ao exercício físico. Procure formas de exercício prazerosas, que lhe permita manter uma frequência semanal elevada (5-6x por semana, idealmente). A intensidade deverá naturalmente oscilar entre moderada e vigorosa. Há um efeito cumulativo na construção da imunidade. Os indivíduos que são mais consistentes ao nível da sua prática de exercício estruturado têm menor incidência de doenças, registam uma maior eficácia ao nível da vacinação e têm um sistema imunitário mais vigilante. A prática de meditação também tem mostrado resultados na prevenção de infecções respiratórias, e é importante na gestão do stress e na melhoria do bem-estar geral.
  3. Em função da sua condição, privilegie formas de exercício seguras que permitam realizar intensidades elevadas de curta duração (a evidência aponta como limiar 60 minutos de duração) ao invés de intensidades elevadas de longa duração. A lógica do “no pain, no gain” é simplesmente imbecil e só faz sentido se você não estiver preocupado com a sua saúde e longevidade. Os eventos de endurance de intensidade elevada poderão suprimir o sistema imunitário e aumentar o risco de doença e infecção do trato respiratório, especialmente se não tiver os cuidados adicionais na sua preparação. No que diz respeito à intensidade, podemos compreendê-la de duas formas: 1) intensidade ao nível da activação neuromuscular / contracção muscular (com a utilização de vários protocolos de treino de força) e 2) intensidade ao nível da capacidade dos sistemas energéticos (com a utilização de vários protocolos de treino de métodos intervalados e/ou de métodos contínuos). Intensidades elevadas, se pensarmos numa escala de 1 a 10, em que 1 é pouco intenso e 10 muito intenso, referimo-nos a uma percepção de esforço de oito para cima.
  4. Em função da sua condição, privilegie programas de treino baseados no desenvolvimento de motricidade e literacia física, que fomentem a (re)aprendizagem de padrões de movimento fundamentais (agachar, empurrar, puxar, levantar, carregar, rodar, locomoção) de forma assistida ou resistida, com variabilidade de movimento consequente, no desenvolvimento atlético e que envolvam maiores quantidades de massa muscular. Quanto maior a massa muscular envolvida e a intensidade aplicada, maior será a comunicação cruzada entre os seus músculos e os vários sistemas do corpo, entre os quais o sistema imunitário. Reforço mais uma vez: a intensidade pode ser benéfica mas precisa de ser bem gerida. Não esqueçamos aquela célebre frase utilizada na Medicina: a dose certa é o que diferencia o veneno do remédio.
  5. Em função da sua condição, privilegie programas de treino que potenciem o desenvolvimento de mobilidade articular, de força e de massa muscular. O desenvolvimento de mobilidade vai melhorar a saúde das suas articulações, optimizar amplitudes de movimento e desbloquear o seu potencial de movimento. O desenvolvimento de força será fundamental para manter a autonomia motora e a independência funcional nas tarefas diárias / desportivas. O desenvolvimento de massa muscular irá contribuir para aumentar a sinalização anti-inflamatória e imuno-reguladora ao longo da sua vida. O músculo é a farmácia endógena do ser humano mas este precisa do estímulo certo para poder manter-se saudável e funcional.

Finalmente, se ainda está a pensar nos 60 minutos de duração do exercício como o critério fundamental para a sua prática, não está a pensar bem. O aspecto mais importante será mesmo a prescrição de exercício com qualidade, será a qualidade do exercício que irá resolver os seus problemas de saúde, melhorar a sua função corporal e o seu bem-estar geral. Porque se o mesmo for prescrito com qualidade a duração da sua prática torna-se um factor acessório.

Bons treinos!

Pedro Correia

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Dado os tempos que vivemos, em que o contacto social está condicionado, proliferam a promoção de serviços à distância em todas as áreas profissionais. Na área do fitness, parece que se descobriu de repente que se pode (e deve) treinar todos os dias e que se pode treinar em casa ou sozinho. É incrível a explosão de publicações nas redes sociais por parte de personal trainers a oferecerem alinhamentos de exercícios para as pessoas executarem em casa. Sabemos que, para uma melhor saúde e resiliência, é fundamental que se faça exercício físico todos os dias, tal como é fundamental alimentar-se e manter a higiene pessoal, mas isto sempre foi assim e, portanto, não é uma necessidade apenas dos tempos actuais. Por isso, publicar um alinhamento de exercícios para todos fazerem vale tanto quanto publicar uma foto do prato de comida ou a lavar os dentes. Serve quanto muito para lembrar-lhe que essas actividades são importantes, mas o conteúdo não é, em grande medida, aplicável a si que lê este texto. Muito menos no que concerne ao exercício. Aliás, pegar no garfo e faca para comer, ou o acto de lavar os dentes são actividades menos complexas do que a execução da maior parte dos exercícios físicos que vemos frequentemente propostos e muito menos a sua organização numa sessão de treino.

A saúde e resiliência resultante do treino é ainda mais relevante em tempos de crise como os que estamos a viver, mas foi sobretudo construída nos meses e anos prévios a este momento. Nomeadamente durante os tais meses e anos que você foi consistentemente ao ginásio fazer o seu treino, muitas vezes com sacrifício. Custa organizar-se de forma a conseguir treinar! Temos família e trabalho e por vezes é complicado conciliar todas as obrigações sociais e profissionais com horários destinados à nossa saúde e bem-estar, neste caso ao treino. E reparem que agora sim falo de treino.

Porque muitos de vocês que estão a ler estas linhas perceberam há muito a diferença entre “fazer exercícios” e treino. Perceberam que “fazer exercícios” é melhor que nada, mas que o treino está a um nível acima. O treino é um processo e obriga a organizar todas as suas variáveis no tempo. Obriga a fazer uma avaliação cuidada da condição inicial, seleccionar exercícios e formas de execução específicas, a observar e avaliar movimento, e fazer os ajustes necessários (e.g. carga, tipo e forma de execução de exercícios) por forma a garantir constante progressão nessa senda da saúde, performance e resiliência. Treinar não é o mesmo que ‘’fazer exercícios” sempre variados e sem critério apenas com o intuito de manter alguma actividade física. E porque alguns percebem essa diferença, têm vindo ao longo dos meses e anos que antecederam os tempos de hoje a fazer os tais sacrifícios organizacionais. E optaram por investir um pouco mais do seu tempo e dinheiro, e regularmente deslocaram-se a um ginásio para obter um serviço de treino. Um serviço em que um programa é seguido, os exercícios não são escolhidos de forma aleatória, e em que a progressão nas cargas utilizadas bem como a execução dos exercícios é monitorizada de perto por um treinador.

Todos os benefícios do treino personalizado são possíveis obter à distância via online. Considero que a forma presencial será sempre superior, mas mediante boa organização e compromisso do treinador e aluno é possível uma progressão constante e essa diferença ser mitigada. Como é que na The Strength Clinic sabemos isso? Porque já o fazemos há vários anos! Além disso, o treino personalizado online pode até ter algumas vantagens em relação ao treino presencial, tais como:

  • Não ter que se deslocar ao ginásio a determinada hora. Este aspecto pode ser uma grande vantagem para algumas pessoas. Se for garantida a auto-disciplina de cumprir o seu programa de treino, o tempo de deslocação e o que isso implica em termos organizacionais é poupado. Além disso, poderá escolher uma hora de treino que melhor encaixe no seu horário sem estar condicionado pela disponibilidade do seu treinador;
  • Maior consistência e empenho na execução dos exercícios. Visto que pode escolher a hora do seu treino, corre menos riscos de falhar a sua sessão de treino pois terá mais flexibilidade em adaptar o horário. Dessa forma, garante mais facilmente a frequência semanal de treinos desejável. Além disso, como recomendamos que documente em vídeo um resumo de cada treino numa plataforma online para que o seu treinador possa observar, isso encerra também um compromisso adicional no cumprimento da sessão e na boa execução dos exercícios;
  • Melhor custo benefício. De facto, poderá usufruir de quase todos os benefícios dum treinador pessoal por um valor mais baixo porque não terá que pagar pelo valor relacionado com despesas de funcionamento e material do local onde ocorreria a sessão de treino presencial;
  • Treinar directamente com o seu treinador preferido. Se o treinador com quem gostaria de trabalhar não tem disponibilidade presencial ou o seu valor presencial é acima das suas possibilidades, a alternativa online irá possibilitar trabalhar directamente com ele.

A mensagem “não deixe de treinar mesmo que seja em casa ou sozinho” no contexto das adversidades que vivemos hoje está correcta! Contudo, esta necessidade não surgiu hoje. É algo que deveria fazer parte das nossas vidas se nos queremos manter mais fortes e saudáveis desde sempre. Para este efeito, treinar é muito melhor do que apenas “fazer exercícios”, sobretudo se retirados de publicações nas redes sociais sem qualquer critério ou consciência corporal e sem programação futura. Serve apenas para “mexer o corpo” e ficar cansado no momento, mas não passará disso mesmo. Porque treinar implica um processo que tem por base os seus objectivos e características individuais. Numa sessão de treino, aquilo que se faz hoje foi em função do que se fez ontem e do que se vai fazer no futuro. E é possível continuar a treinar online e retirar todos os benefícios do treino personalizado, mesmo que à distância. Obriga a um empenho mútuo do aluno e treinador num processo que é conjunto. Esse desenvolvimento pessoal optimizado será sempre o nosso compromisso na The Strength Clinic para consigo. Estamos aqui para guiá-lo nesse processo e não para oferecer treinos “chapa 5” para todos!

Bons treinos!

Nuno Correia

 

O Trenó é um equipamento extremamente versátil que possibilita treinar uma grande variedade de exercícios. A sua utilização é relativamente simples, uma vez que não é tão técnico em relação a muitos outros exercícios, o que faz com que seja possível progredir e obter resultados de forma rápida e segura.

A sua versatilidade permite que seja utilizado com vista ao desenvolvimento de inúmeros objetivos como potência, força, hipertrofia, endurance ou perda de massa gorda, modificando variáveis como a carga, intervalos de tempo, distâncias percorridas e períodos de descanso (atendendo às necessidades fisiológicas do objetivo que se pretende atingir).

As infindáveis variantes que permite realizar faz com que seja uma opção viável quando se pretende incrementar intensidade no treino em praticantes que possam ter algumas limitações, não tolerando exercícios de alto impacto e/ou carga axial.

Para além de todas as razões anteriormente referidas, seguem-se alguns aspetos em que a utilização do trenó pode ser bastante benéfica.

RECUPERAÇÃO ATIVA: Quando realizado com intensidades relativamente baixas é uma ótima forma de aumentar o fluxo sanguíneo nos tecidos ativos com o intuito de promover o processo de regeneração. Os exercícios realizados com o trenó exigem essencialmente ações musculares de natureza concêntrica, resultando num menor número de microlesões em resposta à sobrecarga mecânica, sobretudo quando comparado com outros exercícios de força com predomínio de ações excêntricas. Dessa forma é possível aumentar o fluxo sanguíneo junto dos tecidos em regeneração sem induzir dano muscular, diminuindo assim o período de recuperação.

ACELERAÇÃO: A literatura atual tem apontado a aceleração como um fator determinante no rendimento desportivo. A aceleração é bastante dependente da fase inicial de um sprint, onde a capacidade de realizar um primeiro contacto com o solo de forma explosiva influenciará amplamente a aceleração subsequente. A utilização do trenó, quer pela similaridade de ângulos articulares presentes na técnica de corrida, quer pelo carácter contralateral, em que as forças de reação ao solo são transmitidas de forma unilateral, fazem com que este seja uma ótima opção quando se pretende criar passadas mais rápidas e fortes melhorando a capacidade de acelerar em todas as direções.

REABILITAÇÃO/PREVENÇÃO DE LESÕES: Algumas variantes como o Backward Sled Drag permitem incidir de forma eficaz sobre os quadríceps, realizando a extensão do joelho em pé, em indivíduos que se encontram a recuperar de uma lesão. Esta variante possibilita o trabalho nos últimos graus de extensão do joelho sem uma elevada carga excêntrica sobre os tecidos e sobrecarga da articulação.

Desta forma o trenó tem lugar em programas de treino de força e condição física, reabilitação e prevenção de lesões, sendo possível adequar a sua utilização em prol do objetivo pretendido para praticamente todos os níveis de aptidão física.

Bons treinos!

Patrick Filipe

 

O Press é uma excelente “ferramenta” para construir força e massa muscular ao nível da parte superior do corpo. Está presente em muitos programas de treino de força e condição física, sobretudo no contexto desportivo. Seguem-se algumas das razões pelo qual este deve fazer parte de um programa de treino de força, para além de construir ombros grandes e fortes!

1) DESENVOLVIMENTO MUSCULAR: O Press é um dos exercícios mais efetivos para um desenvolvimento equilibrado da cintura escapular. Apesar do seu foco ser predominantemente no deltóide anterior, este também envolve o deltóide medial e posterior. Além do deltóide também o trapézio é fortemente envolvido na execução, sobretudo no momento do bloqueio final do movimento (Lockout) em que é necessário estabilizar a barra, impedindo que esta se desloque para a frente ou para trás.

2) ESTABILIDADE DO TRONCO: A execução do Press é extremamente exigente para os músculos estabilizadores do tronco. Uma revisão sistemática da literatura (Martuscello et al., 2012) demonstrou, através da atividade eletromiográfica dos músculos estabilizadores do tronco, que exercícios como Agachamento, Peso Morto e Press são mais efetivos quando comparados com exercícios “específicos” para a estabilização do tronco como Abdominal Crunch ou Prancha (com/sem plataformas instáveis).

3) MELHORIAS NO SUPINO: Uma das melhores formas de alcançar uma execução sólida no supino é através da realização do Press. O Press exige uma maior ativação da musculatura da parte superior das costas, fortalecendo músculos responsáveis pela fase excêntrica do supino, sendo esta de extrema importância para a conclusão do movimento. Devido a vários mecanismos de inibição, a progressão ao nível do supino é muitas vezes bloqueada, podendo levar a longos períodos de estagnação. Ed Coan, uma lenda no Mundo do Powerlifting, afirmou ter quebrado um longo período de estagnação após a inclusão do Press na sua rotina de treino.

4) TRANSFER: O Press é um dos exercícios mais vantajosos ao nível dos membros superiores devido ao transfer positivo em inúmeras habilidades no contexto desportivo. A grande maioria das modalidades desportivas exigem o uso da força dos membros superiores para transmitir essa força ao longo de uma cadeia cinética que tem início no chão. Sempre que um atleta empurra um oponente, lança um objeto ou usa uma raquete ou taco para transmitir força para determinado objeto, a força tem início com os pés contra o chão. A força produzida durante a execução do Press não é exclusiva dos membros superiores, envolve todo o corpo de forma a proporcionar a estabilização necessária, ou seja, a produção e transmissão de força entre a base de suporte e a carga movida inicia-se no chão e termina na barra nas mãos.

No entanto, a sua execução é complexa e exigente, é necessário garantir que todas as estruturas envolvidas têm a capacidade para realizar o movimento ao longo de toda a amplitude. Desta forma é possível aprender, consolidar e incrementar carga com segurança, beneficiando de todas as vantagens anteriormente referidas. Para saber se está apto a introduzir o Press nos seus treinos procure o aconselhamento de um profissional qualificado.

Patrick Filipe

Referências:

Saeterbakken, A.H. Fimland, M.S. Effects of Body Position and Loading Modality on Muscle Activity and Strength in Shoulder Presses. Journal of Strength and Conditioning Research 2013, 27, 7, 1824-1831.

Martuscello, J. (2013). Systematic review of core muscle activity during physical fitness exercises. J Strength Cond Res 27(6)/1684-1698.

Rippetoe, M., & Kilgore, L. (2011). Starting Strength: Basic Barbell Training. 3rd ed. Wichita Falls, TX: Aasgaard Co.

 

O Farmer´s Walk pode ser uma “ferramenta” poderosa quando se pretende desenvolver qualidades físicas. Devido à sua versatilidade este pode ser utilizado por qualquer pessoa, seja com o objetivo de ficar mais forte, aumentar a massa muscular e/ou perda de massa gorda. A sua execução é simples: mantenha o tronco e cabeça em posição neutra com o olhar dirigido para a frente, enquanto mantém os ombros ligeiramente retraídos e deprimidos. Contraia os glúteos e abdominais enquanto dá passos curtos, mas rápidos. Passos mais amplos farão oscilar o peso tornando a caminhada instável.

Contudo os seus benefícios vão muito mais além dos anteriormente mencionados! De que forma?

FORÇA DE PREENSÃO: A força de preensão está correlacionada com a força dos membros superiores, força geral do corpo, capacidade funcional e tem um impacto direto sobre o desempenho no treino. Para Gray Cook (2010) este é um dos muitos exercícios classificados como “self-limiting exercise”, ou seja, são autolimitados pela respiração, força de preensão, equilíbrio, postura e coordenação. Alguns exercícios, como o Farmer’s Walk combinam várias características auto-limitantes, sendo a força de preensão a mais decisiva devido ao tempo em que é necessário suportar a carga nas mãos, aspeto que muitas vezes é o fator limitante durante a execução de exercícios com o Peso Morto.

PADRÃO DE MARCHA: Um estudo de Winwood et al. (2014) sugere que o Farmer´s Walk pode ser um estímulo mecânico eficiente na melhoria de vários aspetos do ciclo de marcha. As adaptações neuromusculares, como melhorias na produção de forças propulsoras anteriores e verticais, força e estabilidade do tornozelo, desenvolvimento da cadeia cinética dos membros inferiores e estabilização do tronco, fazem deste uma ótima opção para a melhoria da condição física geral.

ESTABILIDADE DO TRONCO: Segundo o Dr. Stuart McGill (2009) a solicitação muscular que é necessária para manter uma postura vertical, estabilizando o tronco durante a caminhada, incidirá sobre os músculos estabilizadores do tronco como nenhum outro exercício. Quando realizado unilateralmente este tem um caráter de anti-rotação e flexão, fazendo com que os estabilizadores do tronco atuem contra o peso, evitando que o tronco rode e flexione para o lado que transporta a carga. Músculos como o quadrado lombar e os oblíquos têm um papel preponderante para a produção de força no plano frontal, conferindo estabilidade ao tronco e pélvis, auxiliando a coxa durante a produção de força em tarefas como a corrida, mudanças de direção e levantamentos básicos.

É um “finisher” por excelência com uma ampla variedade de aplicações que impulsionam a capacidade de trabalho e condição física para outro nível. Não subestime o impacto deste exercício simples, mas não simplista!

Patrick Filipe

Referências:

Cook, G., Burton, L., Kiesel, K., Rose, G., Bryant, M. (2010). Functional Movement Systems: Screening, Assessment, Corrective Strategies. Santa Cruz, California. On Target Publications.

Winwood, P.W., Cronin, J.B., Cowan, E., Keogh, J. (2014). A biomechanical analysis of the farmers walk, and comparison with the deadlift and unloaded Walk. International Journal of Sports Science Coaching. 9 (5):. 1127-1143.

McGill, S.M., McDermott, A., Fenwick, C.M.J. (2009). Comparison of different strongman events: trunk muscle activation and lumbar spine motion, load, and stiffness. Journal of Strength and Conditioning Research 23(4):. 1148–1161.

 

Um dos mais sérios problemas de saúde pública na Europa é a obesidade. A sua prevalência atingiu proporções epidémicas, pois triplicou nas últimas duas décadas. Segundo a World Health Organization (WHO) em 2010, existiam 15 milhões de crianças e adolescentes que teriam obesidade. Diversas patologias estão associadas à obesidade como a diabetes mellitus tipo 2, doenças cardiovasculares e, mais recentemente, a síndrome metabólica que conjuga os seguintes fatores de risco: obesidade abdominal, hipertensão, dislipidémia e resistência à insulina. Esta doença afeta entre 20 a 30% da população total da Europa (WHO, 2007).

Segundo a revisão de Lobstein, Baur, & Uauy (2004), estima-se que 10% das crianças em idade escolar (5 – 17 anos) em todo o mundo apresentam excesso de peso. Na Europa os valores são ainda mais alarmantes, pois a prevalência atinge os 20%.

Em Portugal, considerando as crianças entre os 7 e 9 anos de idade a taxa de prevalência é a mais elevada de toda a Europa (32%). A epidemia da obesidade tem vindo a progredir de forma alarmante e concluiu-se que aproximadamente 38% das crianças europeias em idade escolar tenham excesso de peso e que mais de um quarto apresentavam obesidade (WHO, 2007).

O treino de força (TF) tem ganho popularidade entre os adolescentes com obesidade. Através de uma correcta prescrição e supervisão, estes programas de exercício são um método seguro de desenvolvimento da força muscular (Nowicka & Flodmark, 2007; Wafs, Jones, Davis, & Green, 2005). Seguindo uma progressão apropriada do volume e intensidade de treino, os adolescentes com obesidade poderão ter sucesso e divertir-se (Nowicka & Flodmark, 2007; Wafs et al., 2005).

O TF ajuda a desenvolver a massa isenta de gordura (MIG) e a atenuar o decréscimo da taxa metabólica de repouso que ocorre em algumas estratégias alimentares de perda de peso corporal (Wafs et al., 2005).

Embora o TF não seja caracterizado por um elevado dispêndio energético, este tipo de exercício é uma componente importante de um programa de perda de peso, pois além de melhorar a força e resistência musculares, influencia positivamente a densidade mineral óssea, a capacidade cardiorrespiratória, a dislipidémia e a composição corporal (Faigenbaum, 2007; Faigenbaum & Westcof, 2007).

Os adolescentes com obesidade apresentam alguma relutância em permanecerem activos devido às dificuldades motoras causadas pelo elevado peso corporal. Daí, considerarem as actividades aeróbias como aborrecidas e desconfortáveis (Faigenbaum & Westcof, 2007; Faigenbaum et al., 2007). No entanto, parecem apreciar o treino de força, porque este caracteriza-se por períodos curtos de esforço, seguidos de uma pequena pausa entre séries ou exercícios. Ao contrário do que acontece com o exercício aeróbio, a sua forma intervalada e não contínua é semelhante aos movimentos e deslocamentos realizados pelas crianças e adolescentes quando jogam e brincam (Faigenbaum & Westcof, 2007; Faigenbaum et al., 2007).

Os jovens com obesidade, por norma, são os mais fortes da turma e recebem feedback positivo, devido à sua capacidade de levantar cargas elevadas nos exercícios de força. Ao contrário do exercício aeróbio contínuo, a participação num TF dá a possibilidade destes jovens se destacarem positivamente perante os colegas com peso saudável. Assim, ganham confiança e motivação para se tornarem mais activos (Faigenbaum & Westcof, 2007; Faigenbaum et al., 2007).

Pedro Ribeiro

 

Referências:

Faigenbaum, A. D. (2007). State of the Art Reviews: Resistance Training for Children and Adolescents: Are There Health Outcomes? American Journal of Lifestyle Medicine, 1(3), 190–200. doi:10.1177/1559827606296814.

Faigenbaum, A. D., & Westcof, W. L. (2007). Resistance Training for Obese Children and Adolescents. President’s Council on Physical Fitness and Sports – Research Digest, (3), 2–8.

Lobstein, T., Baur, L., & Uauy, R. (2004). Obesity in children and young people: a crisis in public health. Obesity Reviews, 5(1), 4–85.

Marshall, W. a., & Tanner, J. M. (1969). Variations in pattern of pubertal changes in girls. Archives of Disease in Childhood, 44(235), 291–303. doi:10.1136/adc.44.235.291.

Nowicka, P., & Flodmark, C.-E. (2007). Physical activity-key issues in treatment of childhood obesity. Acta Paediatrica, 96(454), 39–45. doi:10.1111/j.1651-2227.2007.00169.x

Wafs, K., Jones, T. W., Davis, E. A., & Green, D. (2005). Exercise Training in Obese Children. Sports Medicine, 35(5), 375–392.

World Health Organization. (2007). The challenge in the WHO European Region and the strategies for response: summary. (F. Branca, H. Nikogosian, & T. Lobstein, Eds.). World Health Organization Europe.

 

É muito frequente ouvir relatos de pessoas que passam horas e horas no ginásio e continuam iguais. Não perdem gordura, não ganham massa magra, não ganham força, nem melhoram a sua capacidade funcional. Simplesmente não evoluem. Também temos aqueles que apostam apenas na componente do treino de musculação tradicional para emagrecer e mesmo assim nem sempre têm resultados, independentemente da alimentação que praticam.

Então, qual é o segredo para ter resultados? A programação do treino e a supervisão profissional talvez seja mais importante do que pensa.

No estudo efectuado por Bea et al. (2010), os autores investigaram a associação da frequência do exercício e do volume (peso total levantado no military press e nos agachamentos) com as alterações na composição corporal em mulheres no período pós menopausa que participaram num programa de treino de força progressivo durante seis anos.

As mulheres foram divididas em três grupos: um grupo fez treino de força durante esse período, um começou a fazer treino de força passado um ano e o terceiro (grupo controle) não fez nada. Os programas de treino foram supervisionados por profissionais e envolveram estratégias motivacionais para aumentar a adesão. O programa de treino contemplava oito exercícios (baseados em pesos livres e máquinas) e foi feito três vezes por semana, de forma progressiva.

Os resultados mostraram que apenas o grupo que não fez nada (grupo controle) ganhou peso e gordura ao longo dos seis anos, sugerindo algo que todas as pessoas já deviam saber: se não for feito nada em contrário (ao nível do exercício físico e do estilo de vida em geral) a cada dia que passa vamos ficar mais gordos e fracos.

Mas há ainda algo mais interessante a destacar. Os autores analisaram a relação entre a gordura corporal e o aumento de carga no agachamento e verificaram que as mulheres que ganharam mais força foram as que controlaram melhor o seu peso e a sua composição corporal ao longo do tempo! Ou seja, isto significa que se você está sempre a fazer o mesmo programa, sem atender às variáveis e princípios do treino, o mais certo é a estagnação.

Portanto, aquilo que temos para lhe dizer é que se faz parte daquele pacote que passa horas no ginásio, entre umas máquinas, selfies e conversa com o parceiro do lado, então não estará certamente no caminho para ter bons resultados. Sabemos que a parte da socialização é importante e que não deve ser ignorada, simplesmente cremos que deve ser bem gerida! O fulcral está em saber distinguir muito bem o que é treinar e o que é “ir ao ginásio”. E mais tempo a treinar é um indicador quantitativo, não é um indicador de qualidade.

Bons treinos!

Pedro Correia

Referências:

Bea JW, Cussler EC, Going SB, Blew RM, Metcalfe LL, Lohman TG. Resistance Training Predicts Six-Year Body Composition Change in Postmenopausal Women. Medicine and science in sports and exercise. 2010;42(7):1286-1295. doi:10.1249/MSS.0b013e3181ca8115.

Durante muitos anos tem sido dito às mulheres sobreviventes de cancro da mama para não levantarem nada mais pesado que uma bolsa de mão devido ao risco de linfedema (inchaço/edema causado pela acumulação de líquido linfático nos tecidos da superfície do corpo). Esta acumulação de líquido linfático (linfa) surge como consequência das alterações no sistema linfático devido à cirurgia e/ou radioterapia aos gânglios linfáticos na axila e áreas circundantes.

Neste sentido é recomendado às mulheres para pedirem ajuda com os sacos das compras, para evitarem pegar em crianças e para fazerem formas mais leves de exercício como caminhar, nadar e aeróbica – estas são as recomendações gerais. No entanto, um estudo publicado pelo New England Journal of Medicine em 2009 (ver referência abaixo) veio mostrar que o LEVANTAMENTO DE PESOS pode ser uma ajuda substancial para as mulheres que se encontram nesta situação.

Neste estudo os investigadores escolheram 141 mulheres sobreviventes de cancro da mama com linfedema estável no braço e dividiram a amostra em dois grupos – um grupo fez treino de força e o outro não. Estas foram as conclusões dos autores do estudo: “em sobreviventes de cancro da mama com linfedema, o levantamento de pesos de forma lenta e progressiva não teve efeitos significativos no inchaço do membro e resultou numa diminuição da incidência de exacerbações de linfedema, em sintomas reduzidos e aumento de força.”

Portanto, a questão principal aqui não é se as mulheres que sofrem desta condição podem ou não levantar pesos mas sim COMO o devem fazer para melhorar a sua condição. Mais uma vez, a componente critica é a programação do treino e este ponto é uma das nossas competências distintivas na The Strength Clinic.

Bons treinos!

Pedro Correia

Referências

Schmitz KH, Ahmed RL, Troxel A, Cheville A, Smith R, Lewis-Grant L, Bryan CJ, Williams-Smith CT, Greene QP. Weight lifting in women with breast-cancer-related lymphedema. N Engl J Med. 2009 Aug 13;361(7):664-73. doi: 10.1056/NEJMoa0810118. PubMed PMID: 19675330.

 

No seguimento da temática abordada no último artigo, vamos falar hoje de uma característica bastante comum a todos os jogadores de golfe e que pode estar a comprometer a eficiência do seu swing e a sua performance no campo de golfe: Extensão Antecipada.

O que é a Extensão Antecipada?

A extensão antecipada pode ser entendida como uma parte integrante da perda de postura, mais concretamente quando as ancas e a coluna de um jogador começam a entrar em extensão demasiado cedo no downswing, ou seja, quando as ancas e a pélvis movem-se em direção à bola no downswing. Em termos práticos, se o seu corpo não está devidamente preparado para executar um swing de golfe eficiente, mantendo uma boa postura ao longo de todo o movimento, você vai acabar por levantar a parte superior do corpo (coluna) e falhar na rotação necessária das ancas no momento do impacto. As ancas têm um papel fundamental na prevenção de lesões e na melhoria da performance, se você tem pouca mobilidade nas ancas, mais tarde ou mais cedo, a zona lombar vai queixar-se (e pode ter a certeza que essa situação não será muito agradável).

Segundo os estudos efectuados pelo Titleist Performance Institute, 64,3% dos golfistas amadores fazem extensão antecipada.

Os jogadores que fazem extensão antecipada normalmente referem que se sentem presos durante o downswing como se tivessem que encolher os braços para bater a bola. E é normal que assim seja, repare no seguinte: quando você estende as ancas demasiado cedo no downswing, o espaço que supostamente deveria ser dos seus braços e mãos, foi ocupado pela parte inferior do corpo. Portanto, o resultado final será um bloqueio do movimento, já que os seus braços e mãos não têm como sair do caminho e não vão, certamente, deixar de querer bater a bola.

Como posso diagnosticar?

Uma forma fácil e simples de verificar se você faz extensão antecipada é através do seu Smart Phone (provavelmente você até já tem aplicações que lhe permitem desenhar linhas e analisar o seu swing). Só precisa de pedir a um amigo seu que o filme na direcção da linha de swing e que capte o seu movimento completo desde a posição inicial (setup). Depois de ter o seu swing gravado, compare a posição da sua pélvis na posição inicial com a posição da pélvis na posição de impacto, se notar que a mesma moveu-se na direcção da bola é porque fez extensão antecipada. Se isto não for possível, pode sempre pedir ajuda ao seu professor de golfe, eu tenho a certeza que ele terá todo o prazer em ajudá-lo (diga-se de passagem que é sempre melhorar recorrer a um serviço profissional e que uma câmara de alta definição tem as suas vantagens).

Quais as limitações físicas?

“If you’re not assessing, you’re just guessing” – Greg Rose

As limitações físicas podem ser várias e para determinar ao certo as causas que lhe estão a afectar, seria importante fazer uma avaliação funcional com um profissional que compreenda como deve mover-se o seu corpo e a sua relação com o swing de golfe. De acordo com aquilo que tenho observado na minha prática, gostaria de destacar as seguintes:

  • Limitação na realização de um agachamento completo com os braços em extensão acima da cabeça;
  • Limitação de mobilidade nas ancas (principalmente na rotação interna da anca mais próxima do alvo e no movimento de anteversão e retroversão);
  • Limitação na capacidade de separar / desassociar as ancas do tórax (X factor);
  • Limitação na capacidade de estabilizar a pélvis por via de uma inibição dos glúteos e dos músculos que constituem o core e abdominais.

O que posso fazer para melhorar?

Apesar das causas poderem variar de pessoa para pessoa, eu tenho quase a certeza que se fizer os seguintes exercícios, você vai melhorar e vai aumentar a funcionalidade do seu corpo para jogar golfe durante mais tempo. Só precisa de 10 minutos por dia.

1. Massagem Miofascial com Roller Stick

1

Utilizando um roller stick, procure pelos trigger points do gémeo e faça uma massagem miofascial na parte interna, na parte central e na parte externa do gémeo, durante 30 segundos em cada área. Os pontos que lhe estiverem a doer mais são aqueles que precisam de mais carinho. Sim, este exercício é capaz de doer um bocadinho mas vale a pena.

 

2. Ponte de Glúteos com extensão da perna

ponte

Deitado na posição de decúbito dorsal, faça força com os calcanhares contra o chão, aperte os glúteos e eleve as ancas para formar uma ponte de glúteos, com os braços para cima. Uma vez nesta posição, estenda uma perna e forme uma linha recta entre os ombros, ancas e calcanhar. Aguente esta posição durante 20-30 segundos, mantendo sempre as ancas elevadas. Troque de perna e repita 5 vezes de cada lado.

 

3. Agachamento com extensão dos Braços

squat

Na posição de agachamento (calcanhares no chão e joelhos para fora), levante um braço para cima, levante o outro braço (olhe sempre para a sua mão) e depois levante ambos os braços ao mesmo tempo e volte à posição de pé. Se não conseguir fazer o agachamento sem levantar os calcanhares pode utilizar uma toalha enrolada ou uma tábua para manter os calcanhares elevados. Faça 2-3 séries e repita 8-10 vezes.

 

4. Agachamento Assistido com Bola Medicinal

squat cm bola

Na posição de pé, com os pés à largura dos ombros e ligeiramente rodados para fora, segure uma bola medicinal (ou um balde de bolas cheio) à frente do corpo, e comece a baixar lentamente para a posição de agachamento mantendo as costas direitas e sem levantar os calcanhares do chão. Faça 2-3 séries e repita 10-12 vezes.

Espero que estes exercícios lhe possam ser úteis, e lembre-se: o swing que consegue fazer está directamente relacionado com aquilo que o seu corpo está preparado para fazer.

Até breve!

Pedro Correia

 

Se ainda faz exercício para “queimar calorias”, ainda não percebeu a finalidade de um programa de treino físico e da importância que o movimento tem nas nossas vidas. O menos importante do exercício é queimar calorias! E é isso que eu vou tentar explicar neste artigo.

Repare, muitas coisas queimam calorias: tomar banho, comer e digerir pastéis de belém, conduzir o carro, engomar, ver filmes de terror, limpar a casa e o famigerado “andar a pé” (muita gente ainda pensa que isto resulta para ganhar massa magra!). Aquilo que sei, é que estas actividades, embora gastem calorias, de certeza que não vão ajudá-lo(a) a ter o corpo que quer e o corpo que precisa para ter uma vida com qualidade.

O poder do exercício vai muito além da queima da calorias, o gasto calórico é apenas um efeito secundário (agradável) do tipo de exercício que realizamos. O exercício consiste em potenciar a libertação de moléculas e hormonas poderosas que “falam” com os orgãos do nosso corpo (não são apenas os alimentos que têm este tipo de influência), e que determinam aquilo que vai acontecer. E, normalmente, quanto maior a intensidade, mais benéfica é a resposta hormonal.

Portanto, um programa de treino físico bem desenhado tem a ver com o aumento dos níveis de energia, precisão de movimento, vigor, força muscular, mobilidade, agilidade, velocidade, capacidade de trabalho e com uma melhoria do perfil hormonal.

A Febre das Calorias

Ainda vejo muitas pessoas preocupadas com as calorias dos alimentos, com as calorias que gastam a fazer exercício, com as calorias que consomem por dia e pergunto: Como é que chegamos até aqui? Que tipo de mensagem é que anda a ser propagada para que as pessoas estejam tão obcecadas com as calorias? Será que a contagem de calorias é assim tão importante? Vamos ver.

Os cientistas, para descobrirem a quantidade de energia dos alimentos, queimam amostras de alimentos numa bomba de calor. E, que eu tenha conhecimento, uma bomba de calor não tem a mesma fisiologia e composição genética de um ser humano. Que eu saiba, uma bomba de calor não depende do funcionamento dos vários sistemas do corpo humano que, por mero acaso, têm um papel fundamental na forma como essa energia é aproveitada e utilizada (exemplos: sistema digestivo, endócrino e nervoso). Este tipo de pensamento não me parece ser sustentado e tenho muitas dúvidas da sua eficácia no longo prazo. Este tipo de pensamento é demasiado redutor e não resolve o principal problema – a falta de educação das pessoas no que diz respeito à importância daquilo que comemos ao longo das nossas vidas. Será que sou só eu que acha estranho que a maior parte das pessoas informa-se mais sobre os seus telemóveis, carros e computadores do que com a origem e composição da sua própria comida?

Aliás, basta olharmos à nossa volta para percebermos que este não é o caminho!

É verdade que se temos o objectivo de perder massa gorda, é preciso criar um défice energético, ou seja, a relação entre a quantidade de calorias (energia) que entra no nosso organismo e a quantidade de energia (calorias) queimada, tem que ser negativa. Essa é a regra número um nos programas de perda de peso mais rígidos e por isso é que vemos os concorrentes do Peso Pesado a treinar várias vezes por dia.

(Nota: recordo que o Peso Pesado é um concurso em que o objectivo é perder peso no menor tempo possível, não é um concurso para ver quem é que sai de lá com mais saúde – se fosse assim não havia audiências).

No entanto, isto tem muito mais que se lhe diga. Existem calorias boas e calorias más. Os alimentos que ingerimos, além de terem um determinado número de calorias (que, em bom rigor, pode ser bastante impreciso e variável entre si), têm também diferentes propriedades no que diz respeito à sua composição de macronutrientes (proteína, gordura, hidratos de carbono) e micronutrientes (minerais, vitaminas, fitoquímicos). E são estas propriedades e compostos bioactivos que fazem a diferença e que devem ser estudadas inicialmente. Na minha forma de ver as coisas, a lógica é aferir em primeiro lugar a funcionalidade dos alimentos (os seus nutrientes) e depois então olhar para a sua densidade calórica, que também pode ser mais ou menos funcional em função dos objectivos, morfologia e condições específicas de cada indivíduo.

(Nota: se ainda pensa que as dietas baixas em gordura são as mais adequadas para perder peso veja os seguintes estudos publicados em 2003 no reputado New England Journal of Medicine aqui e aqui, onde ficou demonstrado que as pessoas com uma dieta rica em proteína e gordura e baixa em hidratos de carbono perderam duas vezes mais peso que aquelas pessoas numa dieta baixa em gordura, a dieta geralmente recomendada pelas principais organizações de saúde).

Voltando às calorias…

Uma vez que esses nutrientes vão depender do funcionamento do nosso sistema digestivo – que, por sua vez, é governado pelo sistema endócrino (pense em hormonas) e pelo sistema nervoso (pense em neurotransmissores) – e da saúde dos orgãos envolvidos no processo de digestão (boca, esófago, estômago, pâncreas, intestino delgado, intestino grosso, fígado, vesícula biliar) está bom de ver que a teia de relações existente no corpo humano é bem mais complexa que a simples contagem de calorias. O Albert Einstein tem uma frase que se encaixa perfeitamente aqui: “make everything as simple as possible, but not simpler”, ou seja, torne as coisas o mais simples possível, mas não mais simplistas.

Aquela famosa frase que diz que “nós somos aquilo que comemos” é apenas parcialmente verdade. Na realidade, nós somos aquilo que comemos, digerimos e absorvemos.

O Poder do Exercício

Quem está minimamente informado no mundo do exercício já sabe que o treino contínuo de longa duração não é o mais adequado para melhorar a composição corporal e pode até ter efeitos opostos (catabólicos), devido ao aumento mais pronunciado dos níveis de cortisol.

Já se sabe disto há muito tempo mas de qualquer forma é sempre importante relembrar. Este estudo publicado por Tremblay A, Simoneau JA, Bouchard C., em 1994, atesta isso mesmo: o grupo que fez 15 semanas de treino intervalado, queimou NOVE VEZES mais gordura que o grupo que fez treino aeróbio. E isto em metade do tempo!

Aquilo que precisa para “queimar calorias” é de aumentar a intensidade dos treinos por determinados períodos de tempo, é este tipo de estímulo que vai elevar o seu metabolismo e acelerar a perda de gordura. Neste estudo, uma sessão de treino de 30 minutos de treino de resistência metabólico em circuito, provocou um aumento de 38 horas no metabolismo – o célebre efeito afterburn ou EPOC (post-exercise oxygen consumption). Vamos colocar isto em perspectiva. Digamos que treinou desta forma na sexta feira de manhã. Por via deste tipo de estímulo o seu corpo vai estar ainda em modo de “queima de gordura” no sábado à noite, quando for jantar com os seus amigos ou com a sua/seu namorada(o).

E porquê que eu insisto na combinação entre uma boa dieta e bom exercício? Porque estou atento àquilo que diz a evidência nesta área. Este estudo de 1999 mostrou que aqueles que fizeram treino aeróbio e treino de força com uma dieta baixa em calorias queimaram 44% mais gordura do que aqueles que seguiram apenas as orientações da dieta. Tal como tenho vindo a dizer, a dieta é o componente mais importante para aquelas pessoas que querem perder massa gorda, no entanto, uma vez que esse aspecto está assegurado, só o treino de força e o treino intervalado podem realmente levar os seus resultados para um nível superior. Na minha opinião, o facto deste estudo ter sido feito tendo por base uma dieta baixa em calorias e com a inclusão de treino aeróbio é limitativo, mas temos que perceber que normalmente são estas as guidelines da ACSM (American College of Sports Medicine). As guidelines deveriam ter como objetivo facilitar a orientação dos profissionais, mas, infelizmente, não é isso que tenho observado, quando falo com alguns colegas.

Creio que já deu para perceber que o tipo de treino que faz pode ser, de facto, um grande aliado para colocar o seu corpo numa situação de défice energético e consequente queima de gordura. Agora vou tentar explicar porquê que isto é o menos importante de tudo. Não se vá embora ainda!

Tal como a nutrição, o exercício físico é chave para a melhoria da saúde, performance e composição corporal. Provavelmente, já estão fartos de ouvir isso. Mas não é qualquer tipo de exercício físico que resulta. Fazer centenas de crunches para perder barriga, utilizar todas as máquinas do ginásio, correr 10 quilómetros por dia, fazer Pilates duas vezes por semana e fazer 100 power cleans no menor tempo possível, não é suficiente. Podem chamar isto de exercício físico, se quiserem, mas não é apenas deste tipo de exercício físico que o nosso corpo precisa. É preciso uma abordagem mais abrangente.

Precisamos de Bom Movimento (não devemos começar logo a correr)

A lógica do “mexa-se mais pela sua saúde” é insuficiente para as nossas reais necessidades e para melhorarmos a qualidade de vida. Nós precisamos de bom movimento, nós precisamos de adquirir competência de movimento em primeiro lugar. Estou a falar da capacidade de realizar movimentos fundamentais com boa forma. Padrões de movimento fundamentais e funcionais para a nossa vida, tais como: agachar, levantar, empurrar, puxar, andar, lançar, rodar, correr e saltar.

Foto 2 Ainda Faz Exercício para....

Do meu ponto de vista correr deveria ser a última etapa no nosso desenvolvimento neuromuscular e, no entanto, o que não falta são pessoas a correr todas tortas e com evidente défice de força muscular. Mas o problema não é delas, elas até estão a tentar fazer alguma coisa pela sua saúde (e provavelmente é só isso que sabem), o problema é que a maioria delas não sabe que correr é uma habilidade, que requer preparação, prática e treino. O Cristiano Ronaldo não se tornou no melhor jogador do Mundo de um dia para outro, foram precisas muitas horas de treino (no campo e no ginásio) para chegar a este nível. Apesar de ser relativamente fácil e acessível a qualquer pessoa calçar as sapatilhas e ir para a rua, correr também requer preparação, prática e treino (técnico e físico).

É preciso ter estabilidade, mobilidade, força (cada passada que damos no chão está sujeita à ação da gravidade e à velocidade que corremos, gerando forças de 2 a 5 vezes o nosso peso corporal), simetria, movimento de qualidade e boa saúde músculo-esquelética. Correr para ficar saudável e/ou ficar em forma é uma das maiores agressões físicas que podemos fazer ao nosso corpo se não tivermos uma fundação sólida. Primeiro, é preciso estar em boa forma para correr. Se você não tiver boa competência de movimento, o mais provável é acabar lesionado. Segundo a literatura disponível a taxa de incidência de lesão nos corredores pode passar os 90%, isto é mais que qualquer uma modalidade desportiva. Fascites plantares, fracturas de stress, tendinites patelares e dor patelo-femural, são apenas alguns exemplos. Veja esta revisão sistemática se estiver interessado em saber mais.

Mais uma vez, não me interpretem mal, eu não sou anti-corrida e admiro o esforço e capacidade de sofrimento dos corredores. Acho que todos nós devíamos ser capazes de correr (aliás, foi assim que evoluímos enquanto espécie), o problema é que a maioria das pessoas que corre não está devidamente preparada para correr e há etapas fundamentais de aprendizagem que não devem ser descuradas, para prevenirmos desequilíbrios estruturais no funcionamento do sistema músculo-esquelético e potenciais lesões. Cá está, a lógica do “mexa-se mais” não é suficiente.

Uma nova forma de olhar para o Treino

Diferentes tipos de treino podem alterar a forma de funcionamento dos nossos genes e a forma como os mesmos interagem com as nossas células. Com um tipo de treino adequado é possível diminuir a inflamação crónica, melhorar a sensibilidade à insulina, fortalecer o sistema cardiovascular, melhorar o perfil lipídico, abrandar o envelhecimento normal, queimar gordura (como vimos em maior detalhe acima), aumentar a confiança / auto-estima, aumentar os níveis de energia, aumentar a força mental, melhorar os padrões de movimento fundamentais, melhorar uma série de competências físicas que nós precisamos para a nossa vida diária ou desportiva (tais como força, estabilidade, mobilidade, equilíbrio, velocidade, potência, resistência e coordenação) e melhorar o funcionamento dos vários sistemas de energia (ATP-CP, glicolítico e oxidativo). À medida que envelhecemos estas competências diminuem naturalmente, mas a vantagem é que, com um programa de treino mais funcional, é possível inverter e/ou pelo menos atenuar este declínio.

A maioria das pessoas pensa que os genes são o cérebro da célula, elas acreditam que se os genes não lhe dizem o que fazer, a célula morre. Mas se retirar os genes da célula, a célula continua a estar viva, a eliminar produtos de desperdício e a comportar-se tal como outra célula. Portanto, em vez dos genes serem o cérebro da célula, olhe para os genes como se fosse o seu manual de instruções / reparações. Quando uma parte desgastada da célula precisa de ser reparada ou quando novas substâncias precisam de ser produzidas, os genes vão dar as instruções para tal.

Cada célula do nosso corpo está envolvida por uma membrana gordurosa, que está repleta de milhares de receptores. Estes receptores recebem informações de diferentes partes do corpo e passam essa informação para dentro da célula, para formar / codificar novas proteínas, queimar mais ou menos gordura, etc. (Nota: é por este motivo que é importante comermos gorduras de boa qualidade e evitar as gorduras hidrogenadas presentes em grande parte dos alimentos processados, para tornar a membrana celular mais permeável à entrada de nutrientes). É esta membrana com receptores o centro de comando da célula, pelo que se removermos estes receptores da membrana, as células morrem. Isto significa que a função das nossas células é altamente influenciada for factores externos, através de hormonas e outras moléculas que se ligam a estes receptores.

Estas moléculas mensageiras não são criadas aleatoriamente pelo nosso corpo, elas são criadas em função do nosso estilo de vida, dieta, pensamentos, comportamentos, temperatura, luz, som e…tipo de treino. É possível nascermos com alguns genes defeituosos – por exemplo os BRCA 1 e BRCA 2, que aumentam o risco de cancro da mama – mas são estas moléculas mensageiras / hormonas que vão determinar a activação desses genes. Portanto, controlar estas hormonas significa controlar o corpo.

(Nota: Não acham estranho que quase 90% dos cuidados de saúde estão relacionados com a resolução de problemas de saúde, quando 80% dos problemas de saúde / doenças surgem por via do nosso estilo de vida e do ambiente a que estamos expostos? Veja esta TED talk do Dan Buettner para perceber porquê que estamos a caminhar na direcção errada).

O exercício de alta intensidade é aquele que favorece um ambiente hormonal mais favorável, com um aumento de hormonas como a testosterona, hormona do crescimento e IGF-1, de interleucinas com um papel importante na inflamação (IL-6), na manutenção do tecido muscular (IL-15) e na formação de novos vasos sanguíneos (IL-8), de ácido láctico (que tem a capacidade de nos tornar mais jovens ao estimular a libertação de testosterona e hormona de crescimento) e de óxido nítrico, um vasodilatador que tem um papel fundamental na regulação da tensão arterial, aumento de força e disfunção eréctil. Infelizmente, a corrida de longa duração não produz os mesmos efeitos. Movimentos compostos, que requerem uma combinação de força e resistência, em períodos curtos de tempo, são aqueles que vão pôr os seus músculos a “falar” mais com o seu corpo. A queima de calorias é apenas um efeito secundário pouco significativo, quando comparado com a quantidade de hormonas e outras moléculas de sinalização que influenciam a forma como o nosso corpo funciona.

Para que fique claro, estamos a falar de intensidade conjugada com movimento de qualidade. Intensidade conjugada com mau movimento vai ter o efeito contrário: LESĀO.

Conclusão

É urgente dar lugar a uma nova mentalidade no que diz respeito à importância de treinar melhor as competências que vamos precisar ao longo das nossas vidas. E esta é uma séria limitação da maioria das aulas de grupo típicas dos ginásios convencionais. Os instrutores são obrigados a respeitar os tempos e a coreografia. O feedback individualizado é quase inexistente. As pessoas quase que não têm tempo para perceber, quanto mais para aprender os movimentos. E ninguém aprende nada de especial se não souber para quê que isso serve, ninguém aprende nada se não souber, ou melhor, se não sentir quais são as suas implicações práticas. Além disso, a maioria das máquinas nos ginásios inibem a lógica de percepção sensorial e corporal que nós, seres humanos, precisamos. Nós vivemos num mundo tri-dimensional, num mundo de constante adaptação e exploração espacial, portanto não faz sentido que sejam as máquinas e as coreografias das aulas de grupo a ditar as regras do nosso movimento.

E porquê que é importante aprender movimentos eficientes? Em primeiro lugar, um movimento eficiente acontece quando um corpo tem a capacidade de produzir força através de uma acção coordenada entre os vários segmentos do corpo, sem desperdícios de energia e demonstrando uma habilidade natural para explorar uma amplitude de movimento máxima. Em segundo lugar, são estes movimentos eficientes que lhe vão permitir brincar mais tempo com os seus filhos, mudar os móveis lá em casa, melhorar a sua performance no dia-a-dia, no seu trabalho e nas actividades de fim de semana.

Olhe para este tipo de treino como a fundação, o suporte que precisa para ficar mais forte, mais rápido, mais inteligente, mais ágil, mais competente numa série de atributos físicos que lhe vão permitir render mais nas actividades que gosta de fazer. Gostava de começar a jogar Ténis? Golfe? Voleibol? Gostava de começar a fazer Surf? Paddle Board? Halterofilismo? Powerlifting? Dança? Escalada? Triatlo? Gostava de ficar mais rápido quando vai jogar futebol durante a semana com os seus amigos? Obviamente que cada modalidade tem as suas habilidades específicas, mas todas elas partilham da mesma fundação: da capacidade de adaptação do ser humano. Para melhorar de forma segura nestas habilidades específicas, primeiro é preciso melhorar nos padrões de movimento fundamentais. E para melhorar de forma sustentável nos padrões de movimento fundamentais, é preciso treinar melhor e respeitar as etapas de desenvolvimento de cada um.

Resumindo, a grande vantagem de treinar melhor (e recordo aquilo que vimos sobre o poder do exercício, bom movimento e a nova forma de olhar para o treino) consiste em melhorar a sua qualidade de vida, maximizar a sua performance e, sobretudo, dar-lhe a liberdade e a autonomia necessárias para escolher a actividade / modalidade que sempre quis experimentar mas que nunca teve coragem ou oportunidade.

Pense nestas coisas na próxima vez que for ao ginásio, andar na passadeira, colocar os auscultadores e ver uma série qualquer na TV durante 40 minutos, enquanto olha de soslaio para as calorias queimadas no monitor e para os exercícios que as outras pessoas fazem.

Até breve!

Pedro Correia

Referências

Berardi, J, Andrews, R. The Essentials of Sport and Exercise Nutrition. Certification Manual. Second Edition. Precision Nutrition Inc. (2013).

Björntorp P. Hormonal control of regional fat distribution. Hum Reprod. 1997 Oct;12 Suppl 1:21-5. Review.

Frederick F. Samaha, M.D., Nayyar Iqbal, M.D., Prakash Seshadri, M.D., Kathryn L. Chicano, C.R.N.P., Denise A. Daily, R.D., Joyce McGrory, C.R.N.P., Terrence Williams, B.S., Monica Williams, B.S., Edward J. Gracely, Ph.D., and Linda Stern, M.D. A Low- Carbohydrate as Compared with a Low-Fat Diet in Severe Obesity. N Engl J Med 2003; 348:2074-2081.

Gary D. Foster, Ph.D., Holly R. Wyatt, M.D., James O. Hill, Ph.D., Brian G. McGuckin, Ed.M., Carrie Brill, B.S., B. Selma Mohammed, M.D., Ph.D., Philippe O. Szapary, M.D., Daniel J. Rader, M.D., Joel S. Edman, D.Sc., and Samuel Klein, M.D. A Randomized Trial of a Low-Carbohydrate Diet for Obesity. N Engl J Med 2003; 348:2082-2090.

Houston, M. What your doctor may not tell you about Heart Disease. Grand Central Life & Style (2012).

Kraemer WJ, Volek JS, Clark KL, Gordon SE, Puhl SM, Koziris LP, McBride JM, Triplett- McBride NT, Putukian M, Newton RU, Häkkinen K, Bush JA, Sebastianelli WJ.

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Schuenke MD, Mikat RP, McBride JM. Effect of an acute period of resistance exercise on excess post-exercise oxygen consumption: implications for body mass management. Eur J Appl Physiol. 2002 Mar;86(5):411-7. Epub 2002 Jan 29.

Tremblay A, Simoneau JA, Bouchard C. Impact of exercise intensity on body fatness and skeletal muscle metabolism. Metabolism. 1994 Jul;43(7):814-8.

van Gent RN, Siem D, van Middelkoop M, et al Incidence and determinants of lower extremity running injuries in long distance runners: a systematic review British Journal of Sports Medicine 2007;41:469-480.

 

“We don’t believe there is one way to swing a club; we believe there are an infinite number of ways to swing a club. But we do believe there is one efficient way for all golfers to swing a club and it is based on what they can physically do.”

– Titleist Performance Institute

Se está a ler isto é porque provavelmente está interessado em melhorar a sua condição física para fazer mais birdies, bater drives mais longos e para aumentar a sua longevidade enquanto golfista. Ou, se calhar, o seu objetivo é tornar-se no melhor jogador do seu Clube ou ganhar o próximo Campeonato de Match Play. Não importa qual seja a sua motivação, o facto é que se o objetivo é melhorar o seu jogo, isto vai exigir que se prepare um pouco melhor que a maioria dos golfistas que eu conheço. E melhor não significa necessariamente treinar mais tempo!

Se ainda é daqueles jogadores que passa horas e horas a bater baldes de bolas no driving range na expectativa que isso o vai ajudar a melhorar o seu jogo de golfe, precisa de mudar de estratégia. Bater baldes de bolas no driving range e fazer uns chips e putts não é suficiente. Se quer verdadeiramente melhorar a sua performance neste desporto, precisa de incluir na sua prática exercícios de desenvolvimento atlético geral e treino físico específico de golfe, de forma progressiva e periodizada.

Isto significa que aquilo que normalmente vê no ginásio não tem nada a ver com aquilo que precisa para bater mais longe, mais direito e para aguentar os 18 buracos sem se cansar tanto.

Primeiro: Será que o seu swing é eficiente?

A única forma de determinar se o seu swing de golfe é eficiente ou não é através de uma Análise Biomecânica em 3D. Aquilo que podemos ver na tradicional captação de imagens por vídeo utilizada pela maior parte dos profissionais / professores de golfe é apenas o estilo de swing. Há muitos jogadores de golfe que não têm um swing particularmente atrativo (por exemplo Raymond Floyd, Jim Furyk ou John Daly) mas a razão pela qual estes jogadores tiveram ou têm sucesso é porque o seu swing é eficiente. Ter um swing eficiente para um golfista significa transferir energia (sem desperdícios) desde os pés, joelhos, ancas, coluna, ombros, braços, pulsos até à cabeça do taco e, em última instância, até à bola. Com os dados obtidos através do sistema 3D, podemos verificar a sequência cinemática de cada jogador, ou seja, podemos medir a velocidade de rotação de cada segmento corporal envolvido na execução do swing de golfe e determinar se cada segmento está a acelerar e a desacelerar corretamente.

Quando olhamos para o swing do Jim Furyk e para o swing do Ernie Els através da análise em vídeo (e a olho nu), podemos verificar que ambos os swings são bastante diferentes um do outro, no entanto, quando olhamos para a sequência cinemática de cada um, verificamos que é difícil encontrar uma diferença significativa entre ambos os swings. Isto significa que, apesar do Ernie Els e do Jim Furyk terem estilos de swing completamente diferentes, ambos partilham a mesma sequência cinemática.

Todos os grandes jogadores começam por gerar velocidade a partir das ancas e transferem essa energia através do torso, braços e taco. Esta é sequência eficiente no downswing.

O swing de golfe é um movimento complexo multidimensional que implica uma acção altamente coordenada de toda a cadeia cinética (pés, joelhos, ancas, coluna, ombros, braços e pulsos) e que demora menos de dois segundos. O swing de golfe é, portanto, um movimento balístico, que, para executar de forma eficiente, isto é, com uma sequência cinemática correcta, é necessário que os vários segmentos do corpo estejam devidamente preparados para lidar com as forças de torsão e rotação inerentes a esse movimento. Daí a importância do que vem a seguir.

Segundo: A Avaliação Física no Golfe

Antes de chegarmos à parte do treino físico propriamente dito, é importante que fique a conhecer quais são as suas limitações físicas e assimetrias em termos de movimento (uma das principais causas de lesão). Para isso é fundamental que realize uma avaliação funcional para o golfe, de preferência com alguém certificado que saiba aquilo que está a fazer. Da mesma forma que vai ao médico fazer exames para saber como estão os seus marcadores de saúde, deve também fazer uma avaliação inicial com um profissional especialista em golfe, para saber como se está a portar o seu corpo durante um swing de golfe e quais são as principais limitações / compensações.

A Avaliação física no golfe consiste na realização de vários testes com a finalidade de aferir a funcionalidade dos padrões de movimento corporais necessários para o golfe, ou seja, na medição de vários indicadores da sua estabilidade, mobilidade, equilíbrio e vários parâmetros de rendimento como a força, potência e capacidade cardiovascular.

Este tipo de avaliação constitui o ponto de partida para jogar melhor e para prevenir lesões. Se ainda parte do princípio que está tudo bem com o seu corpo e que não precisa de qualquer tipo de intervenção a este nível, o mais provável é que esteja errado e/ou que seja um milagre da Natureza. O nosso corpo não foi desenhado para levarmos o estilo de vida que levamos hoje em dia, portanto pode ter quase a certeza que existem aspectos no seu corpo que precisam de algum trabalho. Se ainda não acredita em mim pense, por exemplo, nos golfistas que conhece que nunca se tenham queixado de dores nas costas ou de dores noutra parte do corpo (pulsos, ombros, cotovelo – golfer’s elbow).

O seu corpo é a peça de equipamento determinante no seu jogo. A qualidade dos tacos, bolas, luvas, sapatos e o mais recente drive ou putt do mercado, não são, certamente, os aspectos mais importantes. Ainda vejo muitos golfistas demasiado preocupados com os adereços e com o estilo de roupa, quando na verdade isso é o menos importante para fazer mais birdies. Aquilo que, de facto, lhe vai trazer melhores resultados é a melhoria das competências funcionais do seu corpo para bater a bola de forma mais eficiente e segura.

Notas Finais

A primeira parte desta série de artigos tem como finalidade chamar a sua atenção para a importância de avaliar a funcionalidade do seu corpo para jogar melhor e durante mais tempo. Muitos jogadores não conseguem executar um swing de golfe eficiente, não só porque o próprio movimento é complexo, mas também porque os seus corpos não estão devidamente preparados para lidar com as forças geradas durante o movimento.

Tenha isto presente na próxima vez que for bater bolas ou que tiver uma aula com o seu professor, se calhar é este o motivo pelo qual não consegue fazer aquilo que o seu professor lhe pede para fazer. Não adianta insistir constantemente na melhoria da técnica se não houver um acompanhamento sinérgico na melhoria das competências físicas. O swing que consegue fazer está diretamente relacionado com aquilo que o seu corpo está preparado para fazer – pense no taco de golfe como uma extensão do seu corpo.

Durante os próximos artigos vamos apresentar as características mais comuns nesta relação entre o corpo e o swing de golfe e sugerir alguns exercícios para que possa melhorar a sua performance no campo de golfe.

Fique atento!

Pedro Correia

 

“Não julgue a força de um homem pelo tamanho do seu bicípite. As coisas nem sempre parecem aquilo que são.”

– Pavel Tsatsouline

Na minha opinião um ser humano normal deve ambicionar ser forte. E quando digo mais forte não falo necessariamente daqueles indivíduos disformes cheios de músculos e que têm um andar esquisito. Qualquer pessoa (de qualquer idade) pode tornar-se mais forte se trabalhar de forma consistente para isso. Infelizmente, a maior parte das pessoas está mais disposta a querer ser forte do que a fazer aquilo que precisa de fazer para ser forte. Sim, são coisas diferentes. E sim, não é fácil. Uma coisa é você querer ter um Porsche topo de gama, outra coisa é você fazer as coisas que precisa de fazer para poder ter um Porsche topo de gama. Com a força passa-se a mesma situação. Para ser forte, você precisa de ter um plano (ou de ter alguém que lhe desenhe um plano) e de trabalhar de forma consistente para cumprir esse plano – este é que deve ser o seu objetivo: cumprir o plano. Mais nada. Você não se torna naquilo que pensa todos os dias, você torna-se naquilo que faz todos os dias. Sim, não há milagres, ninguém fica mais forte sem esforço e sem dedicar o tempo necessário para que isso aconteça. As revistas de fitness e o marketing associado a esta indústria querem fazê-lo(a) acreditar que é possível ficar mais forte ou mais magro sem grande esforço e de forma rápida. É por causa deste tipo de mensagens que as pessoas ainda acreditam em atalhos e/ou ficam agarradas ao poder da genética. Elas querem tudo e depois não fazem nada (nada de jeito pelo menos). E depois ainda culpam a genética!

Há uma coisa que você deve ficar desde já a saber, a força é uma habilidade que se aprende. E, neste sentido, a força é a habilidade de gerar mais tensão nos músculos. E por isso é que a força é a base para o desenvolvimento da velocidade, da resistência e até da flexibilidade. Tal como todas as habilidades, há técnicas ou formas mais adequadas para desenvolvê-la. E é isso que eu vou partilhar consigo. Já viu a sua sorte? Eu vou-lhe dar a conhecer algumas técnicas para você ficar forte mais rápido mas isto só vai resultar se você aplicá-las de forma consistente no treino. Portanto, aplique-as! Algumas destas técnicas já tenho vindo a utilizá-las em mim e com os meus clientes/atletas, pelo que posso assegurar que resultam e que estão cientificamente comprovadas, se isso também lhe interessa. E antes de passar à indicação e descrição das mesmas, não queria deixar de fazer referência ao Pavel Tsatsouline (adoro ler os livros dele), já que tem sido ele um dos indivíduos que mais tem partilhado os “segredos russos” da força e uma das pessoas que mais me tem inspirado nesta jornada. Espero poder vir a conhecê-lo um dia. Preparado(a)? Vamos a isso:

1. Irradiação

Esta é fácil, esta qualquer criança de cinco anos percebe.

Faça primeiro uma série de bicep curl de 5-6 repetições com boa forma, mantendo o cotovelo perto do corpo e sem inclinar o tronco para trás. Pode utilizar um peso livre ou uma barra. Mas um peso livre a sério, não vale utilizar pesos livres ao estilo da Barbie e do Ken, deixe estes instrumentos para as pessoas se entreterem nas aulas de aeróbica! Depois de realizar essa série descanse uns minutos e faça as seguintes alterações: antes de voltar a fazer o movimento, i) aperte aquilo que está a segurar (o peso livre ou a barra) com força; ii) aperte os glúteos como se quisesse partir uma casca de noz com as nádegas e iii) aperte os abdominais imaginando que o Mike Tyson lhe vai dar um soco na barriga.

Se você conseguir fazer estas três coisas, você vai perceber que o peso vai ficar mais leve e, assim, você vai ser capaz de fazer mais algumas repetições – com melhor forma e de forma mais segura. A explicação é esta: quando você consegue criar tensão em vários pontos no corpo isto vai aumentar a estabilidade corporal total (por via dos impulsos neurais emitidos pelos músculos que contraem) e esta estabilidade / força vai irradiar (i.e. espalhar-se) para os músculos vizinhos como se fosse uma corrente elétrica a acender o motor. E o mais interessante disto tudo é que a força de um determinado músculo, por exemplo o bicípite, pode ser amplificada se os músculos vizinhos também ajudarem! Já percebeu porquê que a união faz a força? A fórmula é simples: mais tensão = mais estabilidade = mais força.

2. Bracing / Pré-Tensão

Quem é que ainda faz o braço de ferro na escola? Eu lembro-me perfeitamente dos tempos em que andava na escola e em que esta era uma das brincadeiras que fazíamos nos intervalos das aulas ou quando tínhamos um furo. Lembro-me muito bem do ar angustiante dos meus colegas de turma quando estavam prestes a ser derrotados ou do ar de júbilo que exibiam quando eu lhes deixava ganhar vantagem para depois dar a machadada final. Sim, isto na altura era divertido! E sim, na maior parte das vezes eu ganhava☺.

Eu dei o exemplo do braço de ferro porque esta é a melhor forma de perceber este fenómeno. Vejamos: um indivíduo que consegue gerar mais tensão antes de apertar a mão do seu oponente vai estar com um nível de activação neuromuscular superior e em clara vantagem em relação a um indivíduo que só começa a fazer força quando alguém (o árbitro) dá o sinal para começar o “combate”. De acordo com o Prof. Yuri Verkhoshansky, se criarmos uma espécie de pré-tensão nos músculos antes de iniciar uma contracção dinâmica, isto pode levar a aumentos de performance na ordem dos 20%! Agora imagine a vantagem que você pode ter se conseguir aplicar esta técnica e se o seu oponente não souber disto.

Teste esta técnica da seguinte forma. Faça cinco flexões normais e relaxe no chão entre as repetições. Depois faça outras cinco e desta vez pense em criar tensão no corpo todo, ou seja, pense em apertar glúteos e abdominais antes de empurrar o chão para vir para cima. Se você fizer isto bem, você vai perceber que tem muito mais força do que pensava. Portanto, a chave desta técnica está em criar tensão no corpo todo antes de contrariar a resistência. Se você não criar esta tensão antes, você vai permanecer fraco. Não seja essa pessoa.

4 Formas ficar Forte 2

3. Power Breathing (Respiração em Compressão)

Primeiro, umas breves notas sobre a respiração. Respirar adequadamente é muito importante para maximizar a performance, uma pessoa normal respira em média mais de oito milhões de vezes por ano e o mais provável é que ela não o faça da forma mais eficiente. Se houvesse um padrão de movimento que você tivesse que repetir 23 mil vezes por dia, você não iria desenvolver esforços para tentar melhorá-lo? Pense um bocadinho nisto. A maior parte das pessoas utiliza apenas uma pequena percentagem da capacidade do corpo para extrair oxigénio do ar para os pulmões porque tem tendência em respirar somente com a parte superior do corpo (respiração apical), em vez de realizarem uma respiração mais profunda a partir do músculo respiratório mais eficiente que nós temos, o diafragma (penso que não se fala muito no diafragma nas revistas de fitness / culturismo porque este é um músculo invisível e que não vai propriamente impressionar as mulheres). Mas o facto é que esta respiração que acontece durante o dia vai afectar uma série de coisas: a sua capacidade de recuperação, a sua estrutura anatómica, o funcionamento do seu sistema nervoso autónomo e a sua capacidade cognitiva. Portanto, se estamos a falar de optimização de performance, não se esqueça de melhorar também a funcionalidade do seu padrão de respiração.

Segundo, no que diz respeito ao power breathing (ou respiração em compressão), esta técnica consiste em suster a respiração durante as várias fases do levantamento da carga. Por exemplo, o lendário Bruce Lee costumava dizer que nas artes marciais era mais importante a força da respiração que a força corporal. De uma forma geral, o efeito dos padrões de respiração e da pressão intra-abdominal e intra-torácica na força é estranhamente ignorado ou mal entendido pelos profissionais do fitness e por algumas autoridades médicas. Estas autoridades parece que se esquecem que a lesão ortopédica é muito mais comum que a lesão cerebrovascular. Aquele padrão de respiração tradicionalmente ensinado de inspirar quando baixamos o peso (fase excêntrica) e de expirar quando subimos o peso (fase concêntrica) pode ser útil em alguns casos (e não se pode dizer que esteja errado) mas não é aquele que você quer fazer quando pretende gerar a maior tensão / força possível nos músculos. Porquê? Porque o aumento da pressão intra-abdominal e intra-torácica vai potenciar a excitibilidade muscular (via reflexo pneumo-muscular) e é este processo que vai garantir mais estabilidade na coluna e que vai amplificar a sua força. Esta é a forma mais natural para produzir força! Sim, é provável que o seu instrutor de fitness tenha dito que a exalação forçada do ar contra a glote (i.e. a manobra de Valsalva) seja perigosa para a sua saúde e que você pode ter um AVC a fazer isto. Mas será que isto é mesmo assim? O Prof. Yuri Verkhoshansky e o Dr. Mel Siff, duas das maiores autoridades mundiais na área do treino desportivo, dizem o seguinte a este respeito no livro Supertraining, uma das bíblias do treino de força (a tradução para português é minha):

“Por exemplo, a manobra de Valsalva associada com o suster a respiração tem um papel vital em aumentar a pressão intra-abdominal para suportar e estabilizar a coluna lombar durante o levantamento de pesos pesados…Tem sido corroborado em muitas ocasiões que o stress na coluna está diminuído durante qualquer movimento contra resistências elevadas e que a exalação durante o levantamento aumenta o risco de lesão na coluna lombar. Assim, é imprudente seguir o aconselhamento médico popular que as pessoas têm que exalar durante o esforço.” Os autores acrescentam ainda: “enquanto isto pode ser apropriado para pacientes com doença cardíaca ou hipertensão, esta mesma acção efectuada por um atleta que está a fazer agachamentos ou levantamentos pesados acima da cabeça, pode comprometer seriamente a estabilidade da coluna e a segurança.”

Percebeu? Isto significa que qualquer pessoa saudável pode e deve aplicar esta técnica se tiver como objetivo ficar mais forte e levantar cargas pesadas com maior segurança. Pessoas com hipertensão e com doença cardíaca deverão ter mais cautela neste sentido mas atenção: isto não quer dizer que não possam fazer força, há muitas outras formas para treinar a força. Aliás, já começa a estar bem documentado na literatura científica que estas pessoas podem e devem fazer treino de força para melhorar a sua condição!

4. Indução Sucessiva

A Indução Sucessiva, tal como a Lei da Irradiação que vimos acima, é outras das Leis de Sherrington exploradas ao máximo pelos russos. De acordo com esta lei, a contracção de um músculo – por exemplo, o tricípite – vai fazer com que o seu músculo antagonista – neste caso, o bicípite – fique mais forte que o normal. No início dos anos 80 os cientistas sugeriram que esta técnica causava um efeito de desinibição e, mais tarde, confirmaram que um programa de treino de força que incluía a pré-tensão de um músculo antagonista (i.e. indução sucessiva) era mais eficaz que um programa de treino convencional. E o mais interessante é que esses benefícios não se esgotavam apenas no aumento da performance no momento, mas também em melhorias de força duradouras.

Faça o seguinte teste. Pegue numa barra ou num peso livre e prepare-se para fazer uma série de bicep curl com uma carga que lhe permita fazer 5-6 repetições sólidas. Já sabe, mantenha o cotovelo perto do corpo e não incline o tronco para trás. Faça uma série e conte o número de repetições que consegue fazer com boa forma. Depois de descansar uns minutos, mantenha o mesmo peso e volte a fazer mais uma série, mas desta vez utilizando esta nova técnica. Quando trouxer o peso para cima aplique as outras técnicas que já conhece (irradiação e bracing) e na descida aplique a técnica de indução sucessiva, “puxando” o peso para baixo através do tricípite. Desta forma, você vai dar algum descanso ao bicípite na descida (ao evitar que ele trave o movimento) e vai permitir que o tricípite possa também ter uma participação mais activa no movimento. Você deve esperar conseguir fazer mais uma ou duas repetições desta forma!

Portanto, ao aplicar esta técnica, você vai ter dois motores a controlar o movimento. E por causa da co-contracção de ambos os grupos musculares, esta técnica pode também oferecer maiores benefícios ao nível da estabilidade das articulações já que o stress sobre as mesmas será mais reduzido (nota: não se esqueça de discutir isto com o seu médico se tiver problemas nas articulações).

Aplicadas correctamente, estas técnicas até poderiam fazer do José Castelo Branco um homem!

Finalmente, o meu conselho para si é este: se você quiser começar a levantar cargas mais respeitáveis de forma segura comece a aplicar estes princípios no treino (se não conseguir fazer isto sozinho peça ajuda a alguém que saiba) e aproveite para aprender uma das habilidades que mais falta lhe vai fazer para optimizar a saúde. E seja paciente, não espere aprender todas estas coisas de um dia para outro – é preciso tempo de prática, de boa prática.

Até breve e bons treinos!

Pedro Correia

Referências

Tsatsouline, P. (1999). Russian Strength Training Secrets for Every American. Dragon Door Publications.

Tsatsouline, P. (2003). The Naked Warrior. Master Secrets of the Super Strong – Using Bodyweight Exercises Only. Dragon Door Publications.

Verkhoshansky, Y; Siff, M.; (2009). Supertraining. Sixth Edition – Expanded Version. Ultimate Athlete Concepts.

Verstegen, M.; Williams, P. (2014). Every Day is Game Day. Penguin Group.

 

O Swing é o exercício de fundação do estilo de treino com kettlebells denominado como “hardstyle” e constitui um exercício basilar nos nossos programas de treino na The Strength Clinic. O Swing hardstyle é um movimento explosivo caracterizado pela extensão vigorosa e completa dos joelhos e ancas (na posição do topo) precedida de flexão quase máxima das ancas e ligeira flexão dos joelhos (na posição baixa). O Swing é conhecido pela sua eficácia em melhorar a performance nas actividades da vida diária bem como a performance de atletas das mais variadas modalidades, desde corredores de longa distância a praticantes de desportos de combate, entre outros. Podemos apontar cinco razões que faz do exercício de Swing hardstyle um exercício de eleição para o desenvolvimento atlético:

  • 1. Força. Devido à componente de aceleração e desaceleração inerente ao Swing, este permite adaptações importantes ao nível da capacidade de produção de força com cargas relativamente leves. Recordando a segunda lei de Newton (força = massa x aceleração), é possível incrementar a força a actuar num determinado sistema pela via da aceleração sem aumentar a massa. Neste caso, a carga real manipulada durante alguns momentos da execução do Swing excederá o peso em Kg do kettlebell, podendo a força gerada ascender a 10 vezes mais. Isto permite ganhos de força máxima muito significativos sobretudo na cadeia posterior;
  • 2. Potência. Devido ao seu carácter explosivo com base num padrão de movimento fundamental (i.e. “hip hinge”, o padrão utilizado no exercício de peso morto). A vigorosa extensão das ancas e joelhos está na base de qualquer movimento atlético explosivo. O Swing não só permite trabalhar força explosiva como permite fazê-lo de forma cíclica e repetitiva, e de forma muito segura. Esta característica é uma vantagem do Swing em termos de benefício/risco em relação aos movimentos olímpicos como o Snatch ou o Clean para o desenvolvimento de potência. Pois não só é menos complexo tecnicamente para aprender como permite maior número de repetições sem que a fadiga interfira gravemente com a execução técnica;
  • 3. Estabilização do tronco e força rotacional. O biofeedback oferecido pelo facto de estar segurar um kettlebell e a necessidade de equilibrar as forças geradas pela aceleração e desaceleração do mesmo, “obriga” a uma activação acentuada dos músculos estabilizadores do tronco e do complexo articular dos ombros. Quando efectuado a uma mão, o Swing acentua ainda mais a activação das cadeias musculares cruzadas devido à componente de anti-rotação gerada. Este tipo de geração de potência rotacional manifesta-se nos mais variados gestos desportivos tais como: no swing no golfe; no serviço, na pancada de direita e esquerda no ténis; no remate no andebol; no remate e serviço no voleibol; remate no futebol; lançamentos no atletismo; etc;
  • 4. Endurance muscular e cardiovascular. O Swing com kettlebell (e especialmente devido ao seu design específico) permite a repetição de movimentos explosivos com máxima ou quase máxima aceleração. Essa possibilidade de repetição em segurança e com carga adicional possibilita adaptações cardiovasculares e musculares significativas ao nível do endurance;
  • 5. Perda de gordura. Porque possibilita o estímulo de grande quantidade de massa muscular a uma elevada intensidade e de forma repetitiva, o Swing induz um stress metabólico elevado. Esse stress metabólico resulta num consumo aumentado de oxigénio nas horas subsequentes (i.e. maior gasto de calorias devido ao metabolismo acelerado) e dessa forma contribui fortemente para a perda de gordura.

De facto, o Swing com kettelbell é um exercício extremamente completo. O Swing é igualmente altamente versátil em termos de programação. Pois, ao manipular a carga, número de repetições, tempo de descanso bem como as variações do exercício (e.g. Swing a duas mãos, uma mão, Swing com dois kettlebells, Swing a partir da posição parada) permite facilmente trabalhar adaptações específicas no continuum da força (i.e. desde a força máxima ao endurance muscular) bem como nos vários sistemas de energia. E tudo isto de forma altamente segura!

Sugestão de programa de 12 semanas para perder gordura

Adquira um kettlebell (pelo menos 16kg para mulheres e 20kg para homens) e tenha-o na sua sala de estar ou quarto de dormir. Aprenda a executar o exercício de Swing hardstyle com um profissional certificado. Todos os dias, quer treine no ginásio ou não, execute 5 séries (espalhadas pelo dia todo conforme lhe for mais conveniente) de 20 swings durante a primeria semana, 25 swings durante a segunda semana, 30 swings durante a terceira semana e 35 swings durante a quarta semana. No segundo mês repita o processo com um kettlebell pelo menos 4 kg mais pesado, e no terceiro mês com um kettlebell 8 kg mais pesado. No final das 12 semanas contemple os resultados obtidos!

Bons swings…! 🙂

Nuno Correia

 

A maior parte das mulheres tem receio de levantar pesos como os homens porque pensam que vão ficar grandes e mais parecidas às figuras que vemos na foto à esquerda. É altura de clarificar essa questão e explicar não só porquê que isso é impossível (se não houver recurso a hormonas e/ou esteróides anabolizantes), mas também porquê que o treino de força é fundamental e um grande aliado para melhorar uma série de coisas, inclusivamente a composição corporal.

É bastante recorrente a utilização excessiva de protocolos de treino de baixa intensidade com as mulheres, dá-se demasiado ênfase ao cardio, à utilização de máquinas, às passadeiras, às bicicletas, a cargas demasiado leves, e muito pouco ênfase àquilo que vai promover o maior número de adaptações fisiológicas importantes para o aumento da capacidade funcional das mulheres – o treino de força. Se aquilo que pretende é dar vida aos seus anos e não anos à sua vida (para citar uma pessoa amiga), é bom que comece a olhar para o treino de força como uma das oportunidades anti-aging mais eficazes que existe à face da Terra. Não há sistema nenhum no nosso corpo que não possa ser influenciado pelo treino de força! Já lhe disse também que é mais barato que os cremes que anda a esfregar no corpo todos os dias?

Vou dividir este post em três partes. Primeiro, vamos destacar os mitos do treino de força para mulheres, que já foram abordados por Ebben & Jensen, em 1998, nesta publicação Strength training for women: debunking myths that block opportunity. Segundo, vamos destacar os seus principais beneficios e, terceiro, vamos explicar porquê que você não ficar como o Arnold Schwarzenegger (ou outro indivíduo musculado que tenha dificuldade em coçar as costas).

1. MITOS DO TREINO DE FORÇA PARA MULHERES

i) O treino de força vai causar que as mulheres fiquem grandes e pesadas.

A verdade é que o treino de força ajuda a reduzir a gordura corporal e a aumentar a massa magra. Estas mudanças poderão resultar num aumento ligeiro de peso, já que a massa magra é mais densa que a gordura (nota: se isto a perturba muito deite a balança fora e olhe mais para o espelho!). O treino de força vai resultar num aumento da força, em nenhuma mudança ou numa diminuição no perímetro das parte inferiores do corpo e num ligeiro aumento no perímetro das parte superiores do tronco. Apenas as mulheres com uma predisposição genética para a hipertrofia e que participam em treinos de grande volume e intensidade, é que poderão ver aumentos substanciais na circunferência dos seus membros.

ii) As mulheres devem usar métodos de treino diferentes dos homens.

As mulheres são normalmente encorajadas em utilizar as máquinas e a fazer muitas repetições de forma lenta, porque têm receio que a utilização de pesos livres, de resistências manuais, de movimentos explosivos ou de exercícios que utilizam o peso do corpo como resistência vão causar lesão. Na verdade, não existe nenhuma evidência a sugerir que as mulheres têm maior propensão que os homens de se lesionarem durante o treino de força. Os factores mais importantes para reduzir o risco de lesão assentam no dominio da técnica dos exercícios e na individualização do treino.

iii) As mulheres devem evitar treino de alta intensidade ou treino com cargas elevadas.

As mulheres são normalmente encorajadas a utilizar resistências limitadas no seu treino de força (i.e. halteres leves) mas o problema é que estas cargas demasiado leves estão substancialmente abaixo daquilo que é necessário para promover adaptações fisiológicas. As mulheres precisam de treinar a intensidades suficientemente elevadas para promover adaptações nos ossos, músculos, cartilagens, ligamentos e tendões. Quando a intensidade do exercício é muito baixa, ou seja, quando o estímulo é insuficiente, os beneficios fisiológicos são mínimos. Para maximizar os beneficios do treino de força, as mulheres devem treinar perto do seu máximo. Para as mulheres que já tiveram filhos, imagine que essa é a força que deve fazer para colher os maiores beneficios.

Resumindo, não há razão nenhuma para as mulheres treinarem de forma diferente dos homens no que diz respeito à intensidade do treino, se você pretende resultados diferentes, você precisa de deixar as aulas de aeróbica e os pesos cor de rosa para começar a levantar pesos a sério.

2. BENEFÍCIOS DO TREINO DE FORÇA PARA MULHERES

Além da melhoria na composição corporal (perda de massa gorda e aumento de massa magra), o treino de força vai ajudá-la a:

i) Aumentar a remodelação óssea, ou seja, você vai ficar com os ossos mais fortes e reduzir o risco de osteoporose (LINK, LINK, LINK). Tenha em atenção que os ossos mais fortes também podem ajudá-la a aumentar de peso, mas recorde-se que isto é bom, ossos fortes é sinal de saúde;

ii) Fortalecer o tecido conjuntivo, ou seja, você vai aumentar a estabilidade das suas articulações e reduzir o risco de lesão (LINK). Idem aspas para o ponto anterior no que diz respeito ao aumento de peso;

iii) Aumentar a força funcional para as atividades que gosta de praticar ou para as atividades do seu dia-a-dia (por exemplo: brincar com os seus filhos, carregar as compras do supermercado, subir escadas);

iv) Aumentar a auto-estima e confiança. Um corpo mais forte vai tornar a sua mente mais forte e imparável!;

v) Combater os efeitos da síndrome metabólica e de outras doenças crónicas comuns na nossa sociedade, tais como doenças cardiovasculares, diabetes tipo II, cancro, fibromialgia, artrite reumatóide e Alzheimer (LINK, LINK);

vi) Aumentar a longevidade de forma saudável, o treino de força vai potenciar a libertação de hormonas anabólicas que têm um papel importante na regeneração dos tecidos e no anti-aging (LINK).

Em resumo, além do treino de força ter o potencial de restabelecer a firmeza dos seus glúteos, pele e de definir aquelas partes do corpo que você pensa que só é possível através de cirurgia, de suplementos milagrosos e das técnicas mais avançadas de “tonificação muscular”, este também pode ajudá-la a viver a vida dos seus sonhos.

3. PORQUÊ QUE EU NÃO VOU FICAR COMO O ARNOLD SCHWARZENEGGER?

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As mulheres têm características fisiológicas diferentes dos homens e é por este motivo que as mulheres têm maior dificuldade em ganhar músculo que os homens. Tal como disse no início deste artigo, se não houver recurso a hormonas e/ou a esteróides anabolizantes, é muito pouco provável que as mulheres fiquem parecidas aos homens.

i) Diferenças nas fibras musculares

Apesar das mulheres terem os diferentes tipos de fibras musculares que os homens têm (fibras de contração rápida e fibras de contração lenta), a quantidade de fibras musculares que elas têm e o tamanho das mesmas é mais pequeno que nos homens. Recordo que as fibras de contração lenta (tipo I) são usadas primariamente em esforços de endurance, enquanto que as fibras de contração rápida (tipo II) são usadas primariamente em movimentos rápidos e explosivos. No caso das mulheres, como cerca de 70-75% têm fibras tipo I, fica ainda mais difícil de mover cargas a altas velocidades. Em termos práticos, isto significa que o potencial para o aumento da área de secção transversal do músculo (i.e. tamanho do músculo) e para o aumento da taxa de produção de força é mais baixo nas mulheres que nos homens.

ii) Diferenças na força e potência

A média da força corporal total de uma mulher corresponde a cerca de 60% da média da força corporal total num homem. A média da força da parte superior do tronco das mulheres anda entre os 25 a 55%, quando comparada com os homens. Em relação à força da parte inferior do corpo, parece que é aqui que as mulheres são mais fortes em termos relativos, já que as médias apontam para um valor de 70-75% em relação aos homens. Portanto, não é de estranhar que a maioria das mulheres tenha maior dificuldade em levantar pesos com os braços e com a parte superior do corpo (exemplos: flexões e elevações) do que com as pernas e com a parte inferior do corpo (exemplos: agachamentos e lunges).

iii) Diferenças nas concentrações hormonais

A diferença mais óbvia nos mecanismos que determinam as adaptações ao treino dos homens e das mulheres é a hormona masculina, a testosterona. Tanto os homens como as mulheres produzem testosterona, a diferença é que as concentrações de testosterona nos homens são 10 a 20 vezes superiores aos níveis de testosterona das mulheres! Parece que as mulheres dependem mais da secreção pituitária da hormona do crescimento e de outros factores de crescimento para ajudar a mediar as mudanças no músculo, ossos e tecido conjuntivo. Na verdade, apesar das respostas ao treino de força não ocorrerem da mesma forma, tem sido reportado que as mulheres têm maiores concentrações biodisponíveis de hormona do crescimento no estado de repouso do que os homens. Felizmente, o treino de força e o treino de resistência metabólico (que fazemos no Fat Burn Boot Camp) fazem muito bem esse papel.

Em resumo, se você começar a levantar pesos de forma gradual e progressiva, você vai continuar a manter a sua feminidade, isto é, você pode estar descansada que não lhe vai crescer bigode, barba ou pêlos no peito. Você também não vai ficar mais larga nem cheia de músculos. Antes pelo contrário, você vai ficar mais magra, mais forte, mais jovem, mais inteligente e muito mais atraente ao sexo oposto. Mas não se iluda, para colher os maiores beneficios no treino, você precisa de fazer força a sério e de se mentalizar que esse sofrimento é importante para induzir as adaptações metabólicas que procura (exemplos: melhorar a composição corporal e minimizar o envelhecimento biológico) e que isso não acontece da noite para o dia. Além disso, você vai precisar de tempo, consistência e disciplina. Não existem pastilhas milagrosas.

Para terminar, gostava de deixar o seguinte aviso: antes de começar um programa de treino de força, tenha a consciência que é preciso  ter competência de movimento em primeiro lugar. Tal como você não iria começar a calcular derivadas na Matemática antes de saber somar e subtrair, também não faz sentido começar a levantar pesos livres ou barras olímpicas se você tiver restrições e/ou assimetrias no seu perfil de movimento base e se você não aprender as técnicas inerentes ao treino com cargas externas. A qualidade de movimento é a base, ou seja, este ingrediente terá que vir sempre em primeiro lugar.

Até breve e bons treinos!

Pedro Correia

Referências

Ciccolo Joseph T, Carr Lucas J, Krupel Katie L, Longval Jaime L. The Role of Resistance Training in the Prevention and Treatment of Chronic Disease. American Journal of Lifestyle Medicine July/August 2010 vol. 4 no. 4 293-308.

Cussler EC, Lohman TG, Going SB, Houtkooper LB, Metcalfe LL, Flint-Wagner HG, Harris RB, Teixeira PJ. Weight lifted in strength training predicts bone change in postmenopausal women. Med Sci Sports Exerc. 2003 Jan;35(1):10-7.

Ebben WP, Jensen RL. Strength training for women: debunking myths that block opportunity. Phys Sportsmed. 1998 May;26(5):86-97. doi: 10.3810/psm.1998.05.1020.

Hurley BF, Hanson ED, Sheaff AK. Strength training as a countermeasure to aging muscle and chronic disease. Sports Med. 2011 Apr 1;41(4):289-306. doi: 10.2165/11585920-000000000-00000.

Kraemer WJ, Ratamess NA. Hormonal responses and adaptations to resistance exercise and training. Sports Med. 2005;35(4):339-61.

Nickols-Richardson SM, Miller LE, Wootten DF, Ramp WK, Herbert WG. Concentric and eccentric isokinetic resistance training similarly increases muscular strength, fat-free soft tissue mass, and specific bone mineral measurements in young women. Osteoporos Int. 2007 Jun;18(6):789-96. Epub 2007 Jan 31.

Stone MH. Implications for connective tissue and bone alterations resulting from resistance exercise training. PubMed PMID: 3057317.

Winters KM, Snow CM. Detraining reverses positive effects of exercise on the musculoskeletal system in premenopausal women. J Bone Miner Res. 2000 Dec;15(12):2495-503.

Zatsiorsky V., Kraemer, W. Science and Practice of Strength Training 2nd Edition. Human Kinetics (2006).

 

Seja qual for o desporto, o treino da força, em harmonia com os vários factores do treino (i.e., técnicos, tácticos, físicos e psicológicos) e princípios do treino (i.e., sobrecarga, especificidade, reversibilidade, heterocronismo, especialização, continuidade, progressão, ciclicidade, individualização e multilateralidade) dotará o atleta de mais ferramentas para melhorar a sua performance. No ténis, a força é utilizada para gerar velocidade, potência e resistência. É impossível ter agilidade, velocidade, potência, um sistema anaeróbio desenvolvido e flexibilidade/mobilidade sem níveis de força óptimos (Verstegen, 2003). Adicionalmente, o treino da força é fundamental para prevenir lesões. Porque o ténis é um desporto que implica muitas repetições dos gestos e de características unilaterais, é propício a desenvolver desequilíbrios musculares que aumentam significativamente as probabilidade de lesão. No ténis a maior incidência de lesões reside sobre os ombros e costas, seguidos por lesões no cotovelo, joelhos e tornozelos (Kibler & Chandler, 1994). Aqui, o treino de força específico para o ténis é essencial para manter ou restaurar o equilíbrio muscular adequado.

Definição de Força

A definição de força com base no seu conceito puramente mecânico consiste em toda a causa capaz de modificar o estado de repouso ou de movimento de um corpo traduzido por um vector com uma determinada intensidade, direcção e sentido. É o produto da massa pela sua aceleração (F=m*a). Apesar desta definição de força ser unanimemente aceite, dificilmente ilustra as diferentes componentes da força muscular. Isto, se entendermos a força muscular como uma componente essencial do desenvolvimento das habilidades motoras que se expressa na capacidade de aplicar força para ultrapassar uma resistência (O’Sullivan & Schmitz, 1998).

Porquê o Treino de Força no Ténis?

O desenvolvimento de um programa de força no âmbito do ténis deve ter como objectivo o ganho de “um músculo altamente inervado e com capacidade explosiva”, para que os jogadores possam servir com maior velocidade, para que possam imprimir mais “peso” na bola (por via dum melhor aproveitamento das forças de reacção ao solo), para que possam cobrir mais zonas do court (porque são mais ágeis e rápidos) e para que sintam como se “flutuassem” no court durante todo o dia, e toda a semana (Verstegen, 2003).

Neste sentido é importante dissipar alguns mitos em relação ao treino da força, nomeadamente de que esse tipo de treino fará os jogadores mais lentos e menos ágeis. Apenas o treino de força mal desenhado conduzirá a isso. Na verdade, vários estudos demonstram que ao nível das modalidades olímpicas, os halterofilistas são aqueles que possuem os maiores níveis de potência e estão em segundo (logo a seguir aos ginastas) em níveis de flexibilidade (Jensen & Fisher, 1979).

Tem sido demonstrado que o treino de força adequado não só mantém os níveis de flexibilidade como pode incrementá-los significativamente (Fox, 1984; Jensen & Fisher, 1979; O’Shea, 1976; Rash, 1979). Adicionalmente, o treino de força adequado induz ganhos significativos aos seguintes níveis: na capacidade de trabalho, na composição corporal (i.e., ganhos de massa magra e perda de massa gorda); optimização da utilização energética; libertação hormonal promotora de renovação tecidular e síntese proteica (e.g. o treino de força induz a secreção da hormona do crescimento e testosterona); alinhamento postural; e equilíbrio muscular (Lamb,1984; Stone et al., 1982).

No caso específico do ténis, tem sido comprovado que o treino de força fortalece o sistema imunitário prevenindo o organismo de lesões, e é frequentemente apontado como tendo um efeito psicológico positivo nos jogadores, pois está aliado a um incremento nos níveis de auto-confiança quer durante o jogo (Folkins & Sime, 1981; Tucker, 1983), como fora do jogo (Folkins & Sime, 1981).

Os vários tipos de Força e a sua Aplicação no Ténis

Força de Resistência: capacidade de produzir força no tempo resistindo à fadiga. Permite manter e estabilizar a execução técnica correcta. Esta, em conjunto com a força estática, constituirá a base para desenvolver os outros tipos de força no âmbito do treino de força no ténis.

– Força Estática: capacidade de estabilizar as estruturas articulares permitindo uma melhor transmissão de energia ao longo da cadeia cinética, isto é, sem perdas de energia. No ténis, este tipo de força permite o aproveitamento das forças geradas no solo durante os apoios para imprimir velocidade à bola.

– Força Máxima: valor de força máximo executado numa contracção voluntária contra uma resistência inamovível. É sobretudo um parâmetro de avaliação e neste sentido podemos considerar o seu valor absoluto e relativo (de acordo com o peso corporal). Para o ténis, os níveis de força relativa são mais determinantes do que os valores de força absoluta, pois tem influência directa na velocidade de deslocamento e agilidade do jogador. Deve ser avaliado também o seu Défice de Força (DF) em função dos valores para a Força Excêntrica Máxima (FEM) e Força Isométrica Máxima (FIM). O DF = FEM-FIM. Se o DF> 25% para os membros inferiores (MI), e DF> 50% para os membros superiores (MS), deveremos privilegiar o treino para o aumento da Taxa de Produção de Força (TPF). Se estiver abaixo desses valores o treino de força deverá incidir em métodos hipertróficos.

– Força Rápida – capacidade produzir a maior quantidade de força no menor intervalo de tempo. Compreende:

  • Força inicial (até 250ms da curva força/tempo) – exprime-se na Taxa Inicial de Produção de Força (TIPF) e revela a capacidade de acelerar desde uma posição estática (i.e., velocidade=0);
  • Força explosiva (acima dos 250ms da curva força/tempo) – exprime-se na Taxa Máxima de Produção de Força (TMPF) e revela a capacidade de acelerar até aos níveis de força máxima. É um dos principais indicadores de performance no ténis. Corresponde à fase de aceleração máxima do movimento.
  • Força reactivaforça produzida durante o Ciclo Muscular Alongamento Encurtamento (CMAE). O uso das propriedades elásticas e reflexas do músculo presentes no CMAE influência a TIPF e a TMPF. O treino de força reactiva (i.e., em CMAE) pode contribuir para o aumento da capacidade de aceleração, isto é, para um incremento das TIPF e da TMPF e, consequentemente, para ganhos de força rápida.

– Força Óptima (Verstegen, 2003): é a combinação dos tipos de força acima descritos de acordo com aspectos inerentes ao jogador e à sua performance, tais como: idade; capacidades; estilo de jogo; grau de desenvolvimento; tipo de pisos em que vai jogar.

O quadro 1 especifica quais as características ideais do treino da força no ténis para os vários estádios de desenvolvimento de acordo com o modelo de Desenvolvimento Atlético a Longo Prazo (Balyi & Hamilton,1999).

 

2017-03-01 (1)

 

Conclusão

Em suma, a elaboração de um programa de treino de força deverá consistir numa integração de exercícios de estabilização e recuperação/compensação, em conjunto com trabalho de força de características mais propulsivas, e trabalho no court das componentes da força ligadas à velocidade, agilidade e potência. 

Nuno Correia 

Referências

Balyi, I. & Hamilton, A. (1999). The FUNdamentals in Long-term Preparation of Tennis Players. In N. Bollettieri (Ed.). Nick Bolletieri Classic Tennis Handbook, (pp. 258-280). New York: Tennis Week.

Folkins, C. H. & Sime, M. E. (1981). Physical training and mental helath. Journal of Physiology, 36, 373-389.

Fox, E.L. (1984). Sports Physiology (2nd edition). Philadelphia: W.B. Saunders.

Jensen, C. R. & Fisher, A. G. (1979). Scientific Basis of Athletic Conditioning. Philadelphia: Lea & Fegiber.

Kibler, W. B. & Chandler, T. J. (1994). Raquet Sports. In F.Fu &D. Stone (Eds.), Sports injuries: Mecahnisms, Prevention, and Treatment. Baltimore: Williams & Williams.

Lamb, D. R. (1984). Physiology of Exercise (2nd edition). New York: MacMilan.

O’Shea, J. P. (1976). Scientific principles and Methods of Strength Fitness (2nd edition). Reading: Addison.Wesley.

O’Sullivan, S. B. & Schmitz, T.J. (1998). Strategies to improve motor control and motor learning. Physical Reabilitation: Assessment and Treatement (3rd edition) (pp.225-244). Philadelphia: F.A. davis.

Rasch, P. J. (1979). Weight Training (3rd edition). Duduque: Wm. C. Brown.

Stone, M. H., Byrd, R., Carter, D. et al. (1982). Physiological effects of short-term resistive training on middle-age sedentary men. National Strength and Conditioning Association Journal, 4, 5, 16-20.

Tucker, L. A. (1983). Self Concept: Afunction of self-percived somatotype. Journal of Psycology, 113, 123-133.

Verstegen, M. (2003). ITF Strength & Conditioning for Tennis. In M.  Reid, A. Quinn, & M. Crespo (Eds), Developing strength (pp. 113-135). London: ITF Ltd.

 

Existem várias linhas de evidência a sugerir que a disfunção mitocondrial está associada à sarcopenia (perda de força e massa muscular no envelhecimento). Em cada célula do nosso corpo existem centenas ou milhares de mitocôndrias, elas existem em maior quantidade nos órgãos e tecidos mais ativos (músculos, coração e cérebro). A razão pela qual envelhecemos rapidamente deriva das constantes lesões e insultos que causamos às nossas mitocôndrias. O stress crónico, a falta de sono, as más escolhas alimentares, a falta de exercício físico (em particular treino de força), o álcool, o tabaco, a exposição a poluentes são apenas alguns exemplos de como é que o seu estilo de vida pode influenciar o funcionamento destas pequenas estruturas.

As mitocôndrias são os organelos responsáveis pela produção de energia no nosso corpo, se você está sempre cansado(a), se tem perdas de memória, se costuma ter dores musculares e se é daquelas pessoas que toma medicamentos para o colesterol, hipertensão, diabetes e outras doenças crónicas é muito provável que as suas mitocôndrias não estejam em forma. Mas vamos ao estudo.

Este estudo pode ser considerado um estudo revolucionário pelo seu impacto que tem sobre os benefícios do treino de força em pessoas idosas. Este estudo foi publicado em 2007 e foi o primeiro estudo realizado em humanos (tanto quanto sei) a demonstrar que o treino de força tem a capacidade de reverter o processo de envelhecimento a nível molecular. Se fosse um medicamento ou um suplemento alimentar a demonstrar estes efeitos, eu penso que já toda a gente sabia.

Amostra

Para a realização do estudo os investigadores recrutaram 25 pessoas idosas saudáveis (idade média de 68 anos), que já faziam algum tipo de exercício físico (caminhadas, jardinagem, ténis, golfe, ciclismo) três a quatro vezes por semana e 26 adultos jovens (idade média de 24 anos) relativamente inativos, alguns deles participantes em atividades recreativas.

Os autores seleccionaram idosos relativamente ativos e adultos jovens relativamente sedentários (em relação a outros da mesma idade), de tal forma a estudar o efeito do envelhecimento em idosos saudáveis per si e não apenas o efeito da inatividade física. Todos os indivíduos mais velhos passaram por um processo de triagem minucioso antes de serem admitidos no estudo para garantir a ausência de doenças que poderiam alterar a função mitocondrial.

Todos os sujeitos completaram uma avaliação médica antes de participarem no estudo. Os critérios de exclusão foram: evidência de doença cardíaca (pela história e teste de esforço); hipertensão; doença pulmonar obstrutiva crónica; diabetes mellitus; insuficiência renal; lesão ortopédica e tabagismo. Nenhum dos sujeitos tinha participado anteriormente num programa estruturado de treino de resistência muscular.

Programa de Treino

Os indivíduos realizaram exercícios de resistência com supervisão em dois dias não consecutivos da semana (segunda-feira/quinta-feira ou terça-feira/sexta-feira) durante 26 semanas (seis meses). Os indivíduos realizaram doze exercícios diferentes incluindo chest press, leg press, leg extension, leg flexion, shoulder press, lat pull-down, seated row, calf raises, crunches, back extensions, bicep curl e extensão de tricípite.

Os sujeitos começaram inicialmente com uma série de 50% de 1 repetição máxima (1RM), e aumentaram gradualmente para três séries a 80% do seu 1RM durante o período de intervenção. Os sujeitos testaram o seu 1RM para todos os exercícios a cada duas semanas, e as cargas de treino foram sendo ajustadas de forma a manter 80% do seu 1RM.

Biópsia Muscular

Todos os indivíduos mais jovens (N=26) foram submetidos a uma biópsia muscular (incisão e extração de uma parte pequena de músculo) retirada do vasto lateral (músculo da coxa) antes e depois do estudo de 26 semanas. Os indivíduos idosos (=25) fizeram biópsias antes do estudo e depois (N=14) do estudo. O RNA (ácido ribonucleico) foi extraído a partir do músculo para análise para determinar os genes que se expressavam de forma diferenciada com a idade.

Resultados

Os autores do estudo identificaram 596 genes expressos de forma diferenciada entre os indivíduos jovens e idosos. Destes 596 genes, os investigadores identificaram 179 associados com a idade e exercício que mostraram uma reversão em seis meses de treino de resistência muscular. Isto significa, literalmente, que o treino de resistência muscular não serviu apenas para retardar, mas também para reverter o processo de envelhecimento ao nível genético. As expressões genéticas dos indivíduos idosos mostraram características semelhantes às do grupo mais jovem. Os investigadores também observaram que a disfunção mitocondrial (que afloramos no início do post e que está muito relacionada com a inatividade física) começou a reverter após seis meses de treino.

No que diz respeito à força muscular, aconteceu aquilo que se esperava, ou seja, quem fez força ficou mais forte. A força isométrica das pessoas idosas era inicialmente de 59% menor do que os adultos jovens mas depois de seis meses de treino, as pessoas idosas melhoraram e ficaram 38% mais fracas que os adultos jovens.

Abaixo poderá ver destacado a vermelho as conclusões dos autores do estudo:

Foto Estudo Força

Conclusões

Hoje em dia todas as pessoas sabem que o exercício físico está associado a uma diminuição da morbilidade e da mortalidade em humanos, isto não é segredo para ninguém. O que as pessoas provavelmente não sabem é que existem formas de exercício físico que podem ser mais benéficas que outras para aumentar a força e a longevidade. Este estudo demonstrou, pela primeira vez, que o treino de resistência muscular pode reverter os aspectos relacionados com o envelhecimento ao nível do gene. Sim, você está a ler bem, reverter o envelhecimento a nível molecular!

O facto das pessoas mais velhas terem ficado mais fortes para mim não foi surpresa nenhuma, e não será também para os profissionais que têm o privilégio de trabalhar nesta área. Não é raro termos pessoas mais velhas a começarem a sua prática com pesos mínimos e, em pouco tempo, evoluírem para cargas iguais ou superiores àquelas de jovens de 20 e poucos anos. É tudo uma questão de dedicação e de método.

Durante anos e anos os treinadores pessoais e os profissionais de fitness têm-se fartado de referir aos seus clientes / atletas a importância do exercício físico na melhoria da saúde. Esta mensagem, na minha opinião, não tem sido bem compreendida pelas pessoas em geral, na medida em que as mesmas ainda não compreenderam que o movimento e o exercício físico é tão importante para nutrir o corpo como os alimentos que comem todos os dias.

Em suma, este estudo fascinante está basicamente a dizer-nos que todos nós temos hipótese de aumentar a longevidade (mesmo quando somos mais velhos) e que o elixir da juventude até é algo conhecido e até é algo que está relativamente acessível a toda a gente – o treino de força. O único problema é este: para estes benefícios acontecerem as pessoas têm que estar dispostas a treinar com esforço de forma consistente, um fenómeno bastante raro na nossa sociedade moderada, já que a maioria está mais disposta a tomar uma pastilha milagrosa (e acreditar na fé) que em fazer algo por elas. Portanto, serão apenas os indíviduos focados e aqueles que entendem e aplicam estes princípios no treino (e na vida) que vão acabar por ter mais benefícios – não dependerá da sorte, certamente!

Até breve!

Pedro Correia

Referências

Melov S, Tarnopolsky MA, Beckman K, Felkey K, Hubbard A (2007) Resistance Exercise Reverses Aging in Human Skeletal Muscle. PLoSONE 2(5): e465. doi:10.1371/journal.pone.0000465

 

Se o seu avô / avó é uma pessoa normal, é muito provável que já tenha ido ao médico muitas vezes, que tome vários medicamentos, que não oiça muito bem e que já não tenha a mesma capacidade de locomoção e de raciocínio que tinha há alguns anos atrás.

Os médicos dizem que isto é “normal” e que é típico do avançar da idade, eles até receitam medicamentos com a crença que isso vai melhorar a qualidade de vida dessas pessoas. Não digo que isso não seja necessário para alguns casos, mas também não acredito que isso seja a melhor abordagem para melhorar a saúde da maioria das pessoas que ainda respira na terceira idade.

Há mais de dois anos atrás saiu uma notícia no Público (link aqui), que dizia que as portuguesas viviam cada vez mais tempo, mas com menos saúde. A notícia dizia ainda: “as portuguesas têm uma esperança de vida que é das melhores do mundo, mas desfrutam de muito menos anos saudáveis do que as mulheres dos países melhor classificados na Europa.”

Ao ler a notícia, a primeira coisa que pensei foi: nós temos que ser mesmo muito estúpidos, porque mesmo com os avanços diários da medicina e do conhecimento científico, nós ainda não fomos capazes de perceber quais são as causas que estão por detrás desta longevidade DOENTE. O problema não está no avançar dos anos, o problema está nos conselhos de treta que ouvimos todos os dias sobre nutrição e exercício físico, especialmente nos hospitais. Se as campanhas de prevenção e os folhetos informativos que lá estão fossem realmente suportados pela evidência científica, provavelmente não haveriam tantas pessoas a padecer com dores crónicas, com diabetes, com doença cardíaca, com osteoporose, com sarcopenia, com doenças auto-imunes e com cancro.

Toda a gente sabe que o exercício físico é determinante para o funcionamento do nosso corpo (o nosso cérebro e corpo não se desenvolveu com o rabo sentado na secretária) e, que, ao contrário dos medicamentos, este tem um impacto positivo e auto-regulador nos vários sistemas do corpo humano. Fazer exercício físico é mais eficaz para a saúde que qualquer medicamento patenteado.

“Mas eu ando uma hora a pé todos os dias”

Repare numa coisa, andar a pé é o mínimo que pode fazer para manter o seu corpo a funcionar. Se você me diz que é isso ou ficar recostado no sofá a comer gelados, então é melhor andar a pé. Mas se você me diz que pretende viver uma vida saudável até morrer, ser mais independente, diminuir o risco de quedas, aumentar a auto-confiança, dormir melhor, recuperar mais rapidamente de uma lesão e não fazer parte das estatísticas que vimos acima, aquilo que recomendo é que comece a pensar seriamente a levantar pesos e a fazer treino de força. Andar a pé não lhe vai dar, nem por sombras, os mesmos benefícios do treino de força.

Outra coisa, se você é daquelas pessoas com doença cardiovascular, o seu médico (ou algum Dr. do Google) provavelmente disse-lhe que era importante andar a pé para melhorar a sua saúde cardiovascular. O problema é que isto não lhe vai ajudar muito, a falta de capacidade aeróbia não é um factor de risco para a doença cardíaca, o sedentarismo é que é! – isto significa que você pode ter uma capacidade aeróbia fora do vulgar e uma doença de coração na mesma. Na verdade, de acordo com este estudo publicado em 2006 no jornal da American Heart Association (LINK), com este publicado em 2008 no European Heart Journal (LINK) e com este publicado em 2012 na Mayo Clinic Proceedings (LINK), os maratonistas são aqueles que parecem ter maior risco de desenvolver doenças cardiovasculares.

Mais, de acordo com o cardiologista Henry A. Solomon no livro The Exercise Myth, a saúde cardiovascular refere-se à ausência de doença do coração e dos vasos sanguíneos, e não à capacidade de um indivíduo fazer uma certa quantidade de trabalho físico. Segundo o mesmo médico, a sua saúde geral cardíaca é determinada pela condição de várias estruturas do coração, incluindo o músculo cardíaco, as válvulas, os tecidos cardíacos especiais que transportam os impulsos eléctricos e as artérias coronárias. Ou seja, não espere que o exercício compense ou “limpe” aquilo que pratica na sua alimentação diária.

Esta mania que o cardio é que é bom surgiu no fim dos anos 60/início dos anos 70 por intermédio do Dr. Kenneth Cooper (o criador do teste de Cooper), foi a partir daqui que toda a gente começou a olhar para o VO2 máximo como o santo graal do condicionamento físico. Mas isto não é bem assim, você precisa de treinar de acordo com as suas necessidades e não de acordo com a conveniência da maioria dos ginásios, isto é, passar horas na passadeira / elíptica / bicicleta, percorrer todas as máquinas que lá estão e ignorar o treino com pesos.

Porquê o treino de força?

Porque a força / potência são as capacidades que mais perdemos ao longo da vida e porque vários estudos têm demonstrado que a perda de força e massa muscular estão associadas com um aumento da mortalidade (LINK, LINK, LINK). Felizmente, levantar pesos é o melhor estímulo para contrariar esta tendência e para aumentar a nossa capacidade funcional. Em condições normais, os picos de força acontecem entre os 20 e 30 anos, depois desta idade os índices de força mantêm-se relativamente estáveis ou diminuem ligeiramente durante os próximos 20 anos, se bem que tudo depende daquilo que fazemos no treino.

É na sexta década de vida que as diminuições na força são bastante acentuadas. De acordo com alguns estudos longitudinais, os declínios de força muscular andam à volta dos 15% entre os 60-70 anos de idade e de 30% após os 70 anos. As razões têm a ver principalmente com a perda de massa muscular, com a perda mais acentuada das fibras musculares de contração rápida, com a diminuição da função endócrina, com a perda de mobilidade / elasticidade dos tecidos e com a desidratação celular. Todas estas coisas podem ser minimizadas com um programa de treino adequado.

Sim, é possível começar treinar a força a qualquer idade, eu conheço pessoas que começaram a treinar com 50, 60 e com mais de 80 anos, é tudo uma questão de mentalidade e de força de vontade.

Quer isto dizer que eu devo meter os meus avós a levantar pesos e/ou barras olímpicas sem critério? Claro que não, isso não seria muito inteligente. Para chegar a esse ponto é preciso percorrer um caminho, é preciso avaliar a situação específica de cada pessoa, é preciso criar uma base de movimento sólida, e para isso o melhor que tem a fazer é consultar um profissional do exercício ou preparador físico que percebe de movimento e de treino de força.

Você até pode ouvir a opinião do seu médico (e até acho bem que o faça se fica mais seguro assim), mas lembre-se do seguinte: 1) o seu médico não é especialista em movimento; 2) o seu médico não tem experiência a treinar pessoas; 3) o seu médico, provavelmente, nem sabe levantar pesos. Ou seja, da mesma forma que você não iria pedir conselhos sobre técnicas de cirurgia a treinadores, você também não deveria pedir conselhos sobre metodologias de treino e formas de exercício físico a cirurgiões.

Ah e antes que me digam que eu estou a ser fundamentalista e a sugerir que não se treinem outras capacidades físicas (como a estabilidade, a mobilidade, a resistência, a velocidade, a agilidade, a coordenação motora, a potência), permitam-me terminar com a seguinte observação: o programa de treino de qualquer ser humano no planeta, em condições ideais, deverá ser sempre aquele que induza as adaptações necessárias para os objetivos pessoais.

A palavra chave aqui é adaptação, os mais adaptados estarão melhor preparados para enfrentar qualquer situação. Cada um é livre de fazer aquilo que quiser na sua vida, cada um de nós tem a capacidade de decidir o que fazer todos os dias, para mim o objetivo é aumentar a longevidade e viver até os últimos dias da minha vida a sentir-me forte e espetacular. Qual é o seu?

Até breve!

Pedro Correia

Referências

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